quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O VÍCIO EM TRABALHO E A ROTINA. ESTRESSE EMINENTE.

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Um periquito assado. Esse foi o motivo do seu divórcio. Um casamento que durou quinze anos, acabou desse jeito, por um simples descuido. Mas, será que foi só por isso?


Rubens era um homem honesto e trabalhador. Bom marido, pai exemplar e dono de uma loja de ferragens, um tanto quanto distante de sua residência, mas nada que uns quarenta minutos no trânsito de uma grande cidade não resolvessem. A loja ia bem e estava prestes a comemorar seu décimo ano de existência. A festa seria grande, com a presença dos fornecedores e familiares dos funcionários. Os maiores e melhores clientes também marcariam presença, assim como uma equipe de filmagens mostraria a história da loja e de seu proprietário. E o Rubens no comando de tudo, tendo na esposa o sustentáculo para todos aqueles anos de empreita. Ela, a esposa, comandava a outra loja, uma filial, mais próxima de casa, mas também estava envolvida até o pescoço com a comemoração.


Durante esses dez anos, a rotina comandou a vida do Rubens. A esposa levantava muito cedo e ia para a academia de ginástica, e depois para a visita aos clientes, num marketing muito dirigido e que era o orgulho do Rubens. Era uma excelente vendedora, e sequer poderia pensar em sair da frente desse departamento. Como as ocupações eram muitas, dividiam as tarefas do lar. Então, todas as manhãs, o Rubens acordava, tomava seu banho e ia para a cozinha. Lavava a pouca louça que ficara do jantar, pois a empregada só aparecia após o almoço, alimentava os cães, colocava o gato para fora de casa, trazia a gaiola do periquito para próximo da janela e, na saída, deixava preparado o lanche das crianças e o colocava num forno elétrico com “timer” preparado para ligar uma hora após sair. Tudo isso era feito de uma forma mecânica, sem prazer algum.


Quando entrava em seu automóvel, Rubens sentia um enorme desânimo. Atravessar todo o centro da cidade era terrível, principalmente naquele horário. Mas, tinha que ser feito, então, ligava o veículo e saia, quase esbarrando na lixeira que seu vizinho colocava sempre ao lado de sua saída. Buzinas para cá, freadas para lá, um motoqueiro, sempre o mesmo nos últimos meses, atravessava seu caminho, aquele policial que insistia em ficar olhando feio a cada vez que ele parava sobre a faixa de pedestres, enfim, essa era parte de sua rotina.


Na loja, a balburdia. O corre-corre dos clientes era sempre o mesmo, com gente entrando e saindo a todos os instantes. Eram pessoas de todos os tipos, mas sempre sobrava para ele os piores, aqueles que queriam algo, mas que não sabiam explicar o que era ou como era o produto. Apenas sabiam que queriam algo e pronto. Ele gostava de atender os grandes clientes, aqueles que compravam muito, e não aqueles pequenos, que só precisavam de um parafuso. Mas, cliente é cliente, ele sempre pensou assim, e não seria agora que atenderia de forma diferenciada apenas pela compra ser menor.


E assim, seu dia passava, mas não aquele dia que ele considerava o ideal, e sim, seu verdadeiro dia. A volta para casa era ainda pior, principalmente quando chovia. Buzinas novamente, todos com pressa, trânsito engarrafado. Era o inferno em plena terra. Durante a noite, jantava, dava um pouco de atenção para os filhos, pois mesmo cansado, jamais negou um sorriso ou afeto para as crianças e a esposa, e desabava no sofá, exausto. Se alguém perguntava, dizia que estava tudo bem e que logo “aquela bendita festa” passaria e ele estaria melhor. E a festa veio e passou, mas o Rubens continuou o mesmo.


Os fins de semana vinham e iam, e nada do Rubens se animar. Praia, campo, nada o animava.


Numa determinada manhã, ao acordar, trancou o gato no chuveiro, jogou toda a louça para fora de casa e prendeu o periquito no forno e preparou o “timer”. Ao sair de casa, engatou a ré do veículo e, deliberadamente, atropelou a lixeira do vizinho. No trânsito, quando viu aquele motoqueiro que sempre o ultrapassava, jogou seu carro para a esquerda e o prensou contra um ônibus, quase causando um acidente de grandes proporções. Não satisfeito, parou sobre a faixa de pedestres e, quando o policial se aproximou, aproveitou e fez alguns gestos obscenos para ele e pisou no acelerador, fazendo com que outros veículos freassem bruscamente para não colidirem.


Na loja, mandou que todos fossem para casa e baixou as portas. Ninguém entendeu nada, mas, afinal, ele era o patrão. Tempos depois, umas três horas, atendeu ao telefone e identificou no ato a voz da esposa, nervosa. Sua casa estava em chamas. O motivo? O plug da tomada do forno, que estava para ser trocada fazia alguns meses, não aguentou o tempo de uso contínuo, as duas horas de timer que ele havia pré-programado para assar o periquito, e entrou em curto-circuito, ocasionando um incêndio. Ao chegar em casa e ser cobrado para dar explicações, não suportou e agrediu um dos bombeiros, que atendia seus filhos na porta de uma ambulância. Foi preso em plena agressão.


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Rubens era uma boa pessoa, um bom marido e um pai exemplar, mas era um “workaholic”, um viciado em trabalho. Mesmo dando atenção ao lar, à esposa e aos filhos, sempre colocou seu trabalho antes de tudo, e sequer notou que o fato de ser absorvido demasiadamente pelos afazeres profissionais, além da rotina e do estresse do dia-a-dia, estavam minando sua saúde. Então, sem aguentar mais, seu estado emocional “explodiu”.


Mesmo sem ser um “workaholic”, muitas pessoas desenvolvem uma rotina desgastante, e quando se dão conta, notam que estão com um grau de estresse muito elevado. São pessoas que não são capazes de ver beleza em nada além daquilo que lhes é comum ao seu percurso diário ou aos seus afazeres. Simplesmente, levam uma vida mecânica.


O que custa desviar, de vez em quando, o caminho para o trabalho, evitando assim os mesmos congestionamentos, as irritantes buzinas ou os estressados de sempre no trânsito? Meros minutos que você venha a perder, podem trazer novos ares, coisas diferentes para serem vistas. E no trabalho, pode-se mudar de setor, de tarefas, fazer coisas diferentes, variar um pouco. Nenhum patrão quer ter o seu funcionário afastado por motivos de estresse, e se ele não der ouvidos, acabará pagando por isso, pois poderá perder um funcionário por algum tempo ou, o que é pior, definitivamente.


Em casa, a história é outra, pois ali é que a rotina aperta de vez. E a tarefa de minimizar essa questão é de todos que residem sob o mesmo teto. Ao invés da televisão, por que não ir a um cinema ou teatro? Ou um bom livro? Que tal levar a família para jantar fora? Um passeio em conjunto? E nada de trabalhar no final de semana, pois sequer Deus trabalhou os sete dias. Faça algo diferente nos fins de semana, invente algo, crie alguma alternativa ao que é feito rotineiramente. Mas saia da mesmice.


E nem venha com aquela história de que o mundo é chato e sua vida está uma droga, pois isso é discurso de pessimista e derrotado. A vida é boa e o mundo é lindo. Tem muita coisa por aí para ser feita e aproveitada. Mas, claro, se você acha que o trabalho e a rotina são mais importantes, tudo bem. A depressão e o enfarte também propiciam uma excelente rotina, após acometerem alguém. A rotina dos remédios e tratamentos caros e demorados. Mas você adora a rotina, não é?

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