terça-feira, 30 de novembro de 2010

QUESTÃO DE FÉ

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Conto de domínio público, com algumas adaptações.
  
Num passado não muito distante, havia uma senhora muito religiosa nos arredores de uma grande cidade qualquer. Suas idas à igreja eram constantes, fosse o dia que fosse. Mas os domingos eram especiais, e lá estava ela, para cumprir suas obrigações para com Deus.

O rito religioso entrava pelo corpo dessa senhora e a levava quase ao estado de êxtase. Ela se completava naqueles momentos. E quando terminados os ritos, vinha a melhor parte, as conversas variadas e os encontros com os amigos. Falavam de tudo. Falavam dos vizinhos, dos parentes, falavam até de quem não conheciam. E futricavam, nem sempre falando bem. Falavam até do coitado do Padre.

Esta senhora se importava muito com sua vida religiosa, e a cada vez que voltava da igreja, trazia uma pequena pedra e a colocava em um enorme tanque embutido ao chão, nos fundos de sua casa. Ela queria saber, ao fim de sua vida, quantas vezes havia estado na igreja e quantas missões de fé havia cumprido. E, para isto, bastaria contar as pedras que estavam naquele tanque.

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Num determinado domingo, chovera torrencialmente, e a senhora acabou por não conseguir suplantar um rio que separava a sua propriedade do vilarejo onde estava a igreja. Então, sem ter muito que fazer, ajoelhou-se e rezou, ali mesmo, ante aos pingos de chuva que ainda caiam. Ao voltar para a sua propriedade, pegou uma pedra do chão e a partiu ao meio, jogando somente a metade da pedra naquele tanque. Considerou aquilo como apenas metade de sua obrigação no cumprimento de demonstrar sua fé, pois não havia conseguido ir até a igreja.

Os anos passaram e, num determinado dia, a senhora se sentiu muito doente, notando então que sua morte era iminente. Ela, ciente de sua condição, pediu aos filhos que fossem até o tanque que continha as pedras e as contassem. Seria aquele o momento que tanto esperara. Saberia, por fim, o tamanho de sua fé.

Ao voltar, os filhos carregavam um ar estarrecido na face. E nas mãos, traziam apenas a metade de uma pedra, a única que encontraram no tanque.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

DOCE MANHÃ

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Olhar, pela manhã
a face cândida,
tão inocente e preguiçosa.
Tocar o ombro nú,
arrepiado pelo frio,
e sossega-lo com as cobertas.
Ouvir o murmúrio
da boca boba,
dantes coberta de beijos.
Sentir o suspiro
tão íntimo
que o sono exprime.
E antes de sair,
te deixar ali,
enlevada por um carinho.
Sentir, diante da porta,
a vontade de voltar
mesmo antes de ir.
E na volta,
me entregar novamente
aos encantos do teu olhar.
De tudo que posso ouvir,
são poucas as palavras que quero ter,
aquelas que só tua boca sabe me dizer.
Então, quando me aquecer,
me olhando e me derretendo, só diz:
Eu te amo.


sábado, 27 de novembro de 2010

MULHER EM FÚRIA

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Para um casamento perfeito, uma lua de mel perfeita. E assim passaram três anos, do começo do namoro até chegarem naquela linda pousada, na beira-mar.


O local era paradisíaco, com o mar batendo suas ondas durante a noite, num murmúrio hipnótico. E daí? Eles sequer ouviram o mar. Passaram dois dias trancados naquela cabana, sem sair nem para respirar. Mas, como sempre esquecemos algo, a bela recém casada precisou ir ao banco mais próximo por um motivo qualquer. Arruma daqui, ajeita dali, beijinho carinhoso no marido que ficaria na cabana, e lá foi ela. Na saída, quase tromba com uma atendente, loira alta e linda, e com um vestido vermelho bem chamativo. Pouco ligou e continuou andando, olhando ao redor e achando tudo engraçado. Agora é que se dera conta como o local era belo, com todas aquelas cabaninhas próximas umas das outras. Estranho. Eram todas iguais.


Já diante do banco, cadê a bolsa? Correu para o veículo e saiu apressada, quase querendo esfregar os olhos para desembaçar a visão turva. Entre pequenas corridas e tropeços, chegou até a cabana e estaqueou. Porta entreaberta. Entrou desconfiada e notou de imediato a outra porta, a do quarto, trancada. De lá, vinham sussurros, não, vinham gemidos. Quando olhou pelo chão, um apito estridente pôs seu cérebro em alerta. Um vestido vermelho num canto, meias no outro.


--Uma calcinha vermelha, de rendas? E ainda por cima, fio dental? Esse canalha, eu mato esse safado.


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A fúria a tomou. Num rompante, começou a jogar tudo pelo ar. O que estava ao alcance da mão, foi ao chão. Parou por um instante e tentou ouvir algo que viesse do quarto. Nada. Mas ela os queria ali, na sua frente, face a face. Fósforos. Isso mesmo. Com o fogo, eles sairiam.


Uma hora depois, com todo o caos que se instalou no local, um policial conversava com nossa bela recém casada. Ao lado dela, o marido tentava remediar a situação.


--Eu avisei. --dizia ele. --Tantas vezes eu te avisei que isso iria acontecer.


  --Tá bom. --ela respondeu, irritada. --Nunca mais saio sem minhas lentes de contato. Foi só um errinho! Só me enganei de cabana, que mal há nisso?

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

ALGODÃO DOCE

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Corria ligeirinho, apressado, e parecia que aquela rua não tinha fim. Ah! Mas lá estava ele, o vendedor daquele pedaço de nuvem branquinha, deliciosa e que cola nos lábios. Algodão doce.


A fila estava grande, será que iria sobrar algum? Um só que fosse? Ele, pequenino, saltitava tal qual cabritinho. Os meninos maiores empurravam, pisavam. Mas ele era persistente, iria ficar ali o tempo que fosse, e até sentou para esperar a fila diminuir de tamanho. Aquilo era bom demais. Algodão doce.


Até que ouviu algo que não gostou muito:


--Tá faltando dinheiro, garoto! --o vendedor falava para algum menino. –- Volta prá casa e pede mais prá mãe. Fala prá ela que custam cinqüenta centavos.


Ali sentado, o menininho abriu as mãos e só viu vinte e cinco centavos. A mãe, tadinha, não tinha mais dinheiro. E o pai, se por sorte achasse um emprego, daria, mas também não tinha. Ficou ali, macambúzio, por um bom tempo. Olhava para os demais e notava que se deliciavam, mastigando, chupando aquele pedaço sublime do céu. Levantou e sentiu a barriguinha murcha mexendo e roncando, chamando por aquele doce. Mas ninguém o olhava e nem dariam um teco que fosse. Quando havia somente mais um doce no tabuleiro, meio quebrado, meio amassado e pela metade, foi até o vendedor e fez uma proposta. Seus vinte e cinco centavos por aquele meio algodão.


--Tá sonhando? Vai trabalhar. Ainda ganho uns quarenta centavos neste aqui.


O menininho baixou o rosto, já cheio de lágrimas, e sumiu estrada afora.


Vinte anos depois, aquele mesmo menininho, já homem feito, caminhava com sua enxada nas costas, a caminho do roçado. Ao passar por uma árvore, notou um amontoado de terra e uma placa fixada na árvore, que dizia o seguinte:


“Aqui jaz o doceiro. Mais um esganiçado que a fome matou”.


Pense nos seus atos agora. O que você negar hoje para alguém, amanhã pode faltar para você mesmo. Sempre tem Alguém olhando suas atitudes. Alguém que a tudo vê.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

VOVÓ DO BARULHO

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Texto de domínio público, com algumas adaptações.


Numa tarde ensolarada, um casal já bem velhinho descansava ao lado de um córrego, num belo bosque. Completavam, naquele dia, sessenta anos de casamento, praticamente uma vida inteira. A velhinha, assim do nada, se virou para o velhinho e tascou-lhe um beliscão no braço. O velhinho fez cara feia e, indignado, perguntou:


--Ficou maluca? Por que isso?


      --Isso foi por sessenta anos de sexo mal feito. --ela respondeu.


Aquela resposta foi assimilada com muita surpresa. Ele, ainda ruminando as palavras dela, pensou que pensou, até que virou para ela e devolveu o beliscão, de forma ainda mais dolorosa.


--Aaaiiiiii. Por que me beliscou, meu velho?


      --É por você saber a diferença!


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quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O QUE VOCÊ VÊ NESTE VÍDEO?

Voluntariado GRAAC - Shopping Eldorado


Muitos, podem dizer que é apenas um grupo dançando num espaço público. Outros, podem pensar que é um bando de pessoas que só querem aparecer. Eu digo que são ANJOS HUMANOS.

Não entendeu? Eu explico. Essas pessoas, quase a totalidade das que estão dançando, são voluntárias numa instituição que trata de pessoas portadoras de câncer. Esses voluntários, verdadeiros abnegados , largam seus lares, abrem mão do convívio de seus familiares e amigos, esquecem os passeios e as compras por alguns instantes, e vestem o uniforme da solidariedade, unicamente para “visitar” os pacientes da instituição. Mas, não é uma simples visita. É uma transmissão de carinho, de calor humano, de atenção. Ouvir e compreender a dor alheia, não é para qualquer um. Por isso, chamei esses voluntários de ANJOS HUMANOS. O que eles ganham com isso? O conforto de saber que podem ajudar, nem que seja apenas ouvindo alguém.

No vídeo acima, eles decidiram copiar uma fórmula que já deu certo em outras metrópoles mundiais. Foram para um shopping center, como se fossem pessoas normais e, do nada, apresentaram um verdadeiro espetáculo de dança. E isso tudo, com o único intuito de divulgar ainda mais a campanha do combate ao câncer infantil.

Tempo? Não se iluda, pois o tempo deles é tão ocupado quanto o nosso, mas, eles dão um jeito de arranjar um pouquinho. Situação financeira favorável? Muitos dos que estão ali, tem boa condição financeira, claro, mas alguns são trabalhadores como qualquer outro brasileiro, que dependem do salário ao final do mês para pagar as contas. Com sorte, sobra um pouco para guardar ou fazer um mimo a si próprio.

Não se ajuda a alguém apenas com doação de dinheiro ou bens materiais. Em alguns momentos, uma palavra amiga ou parar para ouvir os problemas de um semelhante, sem nada falar, vale muito mais do que qualquer donativo material.

PÉS DESCALÇOS

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A magia do dia,
Que se completa ao cair da tarde,
Só se torna eterna,
No toque quente dos pés ao chão.
Que medo tens,
Ao relar a terra,
Ao tocar verdadeiramente teu mundo?
Se sentes atrevido?
Teu mundo é puro e teus pés não?
Ou se sentes devorado,
Consumido pelo mundo e sua imensidão?
Que medo tolo,
Que falta de amor próprio!
Limpa a alma,
Respira profundo e te acoraja,
És pecador, também sou,
Mas é teu mundo, toca-o...
E se não te achares no direito,
Melhora teu ser, muda teu viver,
Faz-te merecedor...
Mas lembra-te,
Preserva teu meio,
Cuida bem da tua cercania,
Ou um dia,
Não terás mais chão para pisar.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

OS OLHOS DO POETA

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Certa vez, em uma de minhas andanças, encontrei um velho, cego de nascença, sentado sob a sombra de uma árvore. Ele sorria e contava para algumas crianças sobre as belezas da vida. Perguntei-lhe, então, o que ele conhecia da vida, se era cego. Ele, sem me enxergar, olhou-me nos olhos e respondeu:


“Da vida, trago a flor, que do breu que enxergo, é a minha cor. Eu tenho as montanhas, tão distantes, mas coladas na face, de relva verde e árvores ralas, frias, mas tão quentes que me aquecem o sono. Tenho a lua, branca, pálida, enamorada da menina. Em noite clara, aguça o instinto do mais pétreo mortal, e o faz amar.


Tenho o rio, transparente, que de tão pura água, me embebeda a alma. A mulher vivida, que um dia foi nova, pele rosada, hoje amarrotada, tão menina, que brinca, esperando nos sonhos o seu novo dia. O pássaro, voando alto, tão mais alto que o céu, contrastando seu vermelho vivo com o cinza da chuva, que há de lhe dar de beber. A semente que dá a vida, caída aqui em minha mão, que um dia plantarei.


Tenho o sopro da vida, dado por Deus, e que rufa em meu peito. Tenho o amor, tão cantado pelo poeta, que vive apaixonado, chorando para ter lágrimas e assim fazer sua tinta.


Se sorrio é porque sei do mundo pelos olhos da poesia. E é este o único mundo que quero ver. E não se enganes, pois o poeta me ensina a cada dia. Do amor até a morte, de um tudo eu conheço um pouco”.


Então, sentei e ali fiquei, tal qual criança, aprendendo o que durante uma vida inteira eu não soube como fazer: olhar com os olhos da alma.

domingo, 21 de novembro de 2010

DOR E VENENO

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Batidas secas ecoaram naquele bar vazio. O aspecto do lugar era dos piores, de pouca claridade e com um cheiro insuportável de bebida e fumaça por todos os cantos. De uma porta encortinada, a única que transpassava alguma luz, um homem alto e encasacado apareceu. Pouco se via de sua face, mas mostrava nas mãos a ânsia de estar ali. As esfregava constantemente, e quando não, sequer as mantinha paradas. Olhou pelas mesas e notou num canto uma mulher debruçada sobre uma delas, quase em letargia. 


Um sorriso enigmático apareceu na face daquele homem. Começou a caminhar até a mulher e, ao passar pelo balcão, pegou o único copo limpo e uma garrafa de tequila, sua bebida predileta. Encheu o copo pelo caminho e se aproximou da mesa. Tomou aquela bebida de um só gole e sentou diante daquela mulher. Uma das mãos dela estava sobre a mesa e segurava um pequeno frasco de ricina, deixando ao lado uma taça de vinho tinto pela metade.


--Olá, Carmem? -- o homem falou, em tom suave. -- Aqui começamos e, pelo que vejo, aqui terminaremos. O que você pensou que eu era? --acelerou o tom de voz -- Achou que eu, um homem jovem frente a você, me manteria fiel? Que tolice. O engraçado é que todos os teus amigos te avisaram. E agora eu posso te dizer da quantidade de mundanas que levei para nossa cama. Elas estavam lá, sempre que você saia, se aproveitando daquele leito putrefato em que eu fingia te amar. E sabe, foram nojentas todas as horas em que vomitei palavras nos teus ouvidos para te saciar. Mas, enfim, precisei. Ou então, como me aproveitaria dos teus bens, da tua riqueza? Só me diga... quanto desse veneno você colocou no teu copo de vinho, se é que você ainda pode falar?


A mulher mexeu levemente a cabeça até olhar de frente para o homem. Seus olhos, antes opacos, pareceram faiscar, e da boca saltou um sorriso perverso, que esmerilou as palavras que estavam por vir.


--No meu copo, nenhuma gota. Mas coloquei meio frasco na garrafa de tequila que estava sobre o balcão.

PAPAI NOEL EXISTE?

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Na sexta-feira, dia 19/11/10, fiquei novamente perplexo com outra agressão praticada dentro de uma sala de aula. Uma adolescente, menor de idade, agrediu um professor. O fato aconteceu no interior do meu Paraná. Mas, o que isso tem com relação ao Natal, ou, mais especificamente, com o Papai Noel?

Aprendi muito cedo que o Papai Noel não era quem realmente trazia os poucos presentes que ganhei em minha infância, no Natal. Mas, nem por isso, meus pais deixaram de me passar os princípios que regem a boa convivência, a confraternização e, principalmente, a guardar o Natal como uma data especial e dedicada a celebrar o amor diante do nascimento de Jesus. Enfim, mesmo sabendo que o Papai Noel não existia, nuca desisti dele, e de uma forma ou de outra, sempre o carreguei comigo, como um porto seguro que tenho para guardar minhas esperanças numa sociedade mais justa e humanitária. Parece bobagem o fato de depositar algo tão importante e complexo numa expressão apenas figurativa, como o Papai Noel, mas não é.

Acompanhando algumas crônicas, me vi diante de uma que contestava o bom velhinho, e entendi as razões, religiosas e também de cunho pessoal, que levava a autora a defender a opinião expressada. Mas, independente dessas crônicas, Papai Noel virou garoto propaganda, que vende desde um mero CD, até automóveis de luxo. A depreciação da figura paternal e humanitária vem ganhando corpo, e até alusões piores, como envolvê-lo com jogatina (propaganda de loterias), ou com vaidade e soberba (propagandas de SPA e dietas milagrosas, ou usando objetos que são verdadeiros sonhos de consumo para muitos) acabam disseminando uma visão completamente equivocada sobre ele.

Viajando por novos ares, na blogosfera, encontrei um texto que me cativou, e falava justamente da necessidade de acreditar não apenas no espírito de Natal, mas também na figura de Papai Noel. Mesmo adultos, temos uma necessidade enorme de guardar um pouco daquela inocência que tínhamos quando crianças, de acreditar que tudo vai melhorar de uma hora para outra, de ver um mundo belo mesmo diante de tantas atrocidades que permeiam nossos dias, de desejar algo que sabemos ser impossível conseguir. Essa inocência, essa magia, é que nos mantém confiantes o suficiente para prosseguirmos em nossas jornadas sem desanimar. Quando você deixa de acreditar no Papai Noel, basicamente passa a ver a vida de uma forma mais dura e menos humanitária.

Pode ser errado relacionar o Papai Noel ao brinquedo que uma criança quer ganhar, pois a representatividade dele deve ser atada ao espírito de confraternização, e não de consumismo. Mas, chego a pensar que é um ato desumano e equivocado retirar de uma criança essa visão da imagem de bondade do bom velhinho. As referências altruístas são poucas nos meios em que vivemos, e sem uma figura paterna e benevolente, como é o Papai Noel, a criança perde completamente uma das melhores referências para um amadurecimento sadio neste sentido. Dependerá exclusivamente da educação absorvida do seio familiar, o que, nem sempre, vem sendo repassada de forma adequada. Tira-se completamente a credulidade e inocência de um ser humano, e numa idade em que ele depende muito disso.

E quantos jovens estão crescendo, sem crença alguma? Sem acreditar num Deus sobre suas cabeças, e em quem devem, no mínimo, buscar apoio e respostas para momentos de angústia? Quantos jovens, que perderam ou sequer tiveram fé em algo, estão se tornando cada vez mais agressivos e intolerantes? Então, você pode me perguntar “MAS NO QUE O PAPAI NOEL PODERIA AJUDAR NISSO TUDO?”, e eu responderei “TALVEZ EM NADA, MAS, AO MENOS, ACREDITANDO EM PAPAI NOEL, UM FIO DE BONDADE AINDA EXISTIRÁ EM SEU PEITO, NEM QUE SEJA NUMA MERA CRENÇA.”. Porém, onde ainda existe uma simples centelha, uma labareda pode se formar, mas, se até esta centelha foi sufocada pelas cinzas, lamento, mas para reascender esse fogo, passa a ser muito complicado.

E respondendo a pergunta do título desta crônica, não acredito na existência física de Papai Noel, mas ele está no coração e nos atos de bondade das pessoas, na resiliência humana, na divina crença em um Deus sobre nossas cabeças. Ele existe no amor próprio que nutrimos e, principalmente, no amor e respeito ao próximo. Papai Noel não é um mero garoto propaganda de badulaques para se presentear, ele é o verdadeiro espírito natalino, aquele que tanto buscamos quando pedimos paz e amor para o mundo. Ele existe sim.

sábado, 20 de novembro de 2010

TODA UMA VIDA

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Todas as lembranças de uma vida estavam ali, guardadas naquele pequeno estojo de madeira. Ela o abriu lentamente, sentindo emoções vindas de tempos longínquos, e deixou a mente vagar, numa profusão de odores e luzes que sua mente produziu, até que seus olhos voltaram para o estojo. Retirou dele um crucifixo de madeira, grande, presenteado por seu pai. Olhou ternamente para ele e o pôs de lado. Uma foto de sua mãe, amarelada pelo tempo, mas que ainda mostrava aquele olhar forte, de mulher guerreira, de mulher amiga e de esposa companheira. Saudades afloraram e fizeram lágrimas correrem por seu rosto.


Os minutos passaram e ela, indefesa diante das lágrimas, lembrava dos pais, da velhice deles e de quanto ela os protegeu, até que a morte os levou. Todo um filme passou por seus olhos, desde menina até o derradeiro dia, naquele cemitério cinza e sem vida. Mas, como o tempo passa, e quem está vivo precisa continuar em sua jornada, remexeu mais no estojo. Fitas de seda, três delas, uma rosa e duas azuis. E aquilo era uma felicidade, pois era costume em sua família presentear os amigos com aquelas fitas sempre ao nascimento de um filho. E seus filhos eram lindos, hoje casados, e todos com filhos.


Suspirou. Que bela família ela tinha. Porém, sentia falta de alguém, do homem que escolheu para amar e dividir a vida até os últimos dias. Mas, ele fora primeiro, e sua falta ardia no peito. Ela iria logo, sabia disso, e enquanto não chegasse sua hora, lembraria dele em cada minuto. E assim, deitou-se. Esperou o sono lhe tomar, olhando para as paredes daquele asilo em que os filhos a haviam largado.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

GENTILEZA E SORRISO: FERRAMENTAS PARA MELHORAR O MUNDO

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Você já tentou entender o ser humano? Independente de sua resposta, pare o que está fazendo e pense: por que reclamamos tanto da falta de gentileza, compreensão e carinho que acomete a humanidade? Esse mundo está assim, tão egoísta, que chegamos ao ponto de achar necessário tantas manifestações por uma melhoria fraternal no mundo? O pior é que está.


Vi uma cena rara dia desses. Dois adolescentes, brincando com seus “skates”, pararam o que estavam fazendo e, sem ninguém pedir auxílio, se puseram a ajudar um senhor que se locomovia pela calçada numa cadeira de rodas. E mais, eles ainda se dispuseram a conversar com esse senhor por uns dez minutos e, pasmem, abriram um sorriso por isso. Vou além, e digo que não existia grau de parentesco entre eles e muito menos qualquer amizade. Ajudaram um estranho. E isso é muito triste. Não me entenda de forma errada, pois não é o fato descrito que considero triste, mas sim a questão de ver, constatar, que esse tipo de atitude já não mais existe ou, no mínimo, a frequência com que vemos acontecer é muito pequena.


Olhe para os lados, e me diga quantas pessoas você vê esboçando um sorriso neste momento. Sei, ninguém, pois você está sozinho. Mas, você está sorrindo? Muitas pessoas vivem repetindo que a humanidade perdeu o hábito de sorrir, mas elas próprias não exercitam esse gesto tão simples e salutar. Nem sempre estamos com vontade de sorrir, eu sei, mas repare, se qualquer pessoa sorrir ao nosso lado, faremos o mesmo, por puro reflexo. É contagioso, quase igual ao bocejo. Obviamente, existem momentos de dor extrema em que isso não é possível, mas, na maioria das vezes, acontece sim. E pense, será que aquela pessoa que sorriu e te fez sorrir, tinha motivos para aquilo? Não terá sido um mero gesto de gentileza? Se for, funcionou. Resultado disso: um tão singelo sorriso, ajudou aquele que sorriu e, principalmente, aquele que foi contagiado por esse belo ato. Parece pouco, mas tornou o ambiente mais alegre.


BOM DIA. Ah! Como é bom ouvir isso. “OLÁ, TUDO BEM, COMO ESTÁ?, COM LICENÇA, ME DESCULPE, ME PERDOE”. Ninguém perderá seus dentes por falar algo gentil ou educado para outra pessoa. Sempre existem, claro, aqueles indivíduos pelos quais não nutrimos, ou sequer merecem, muitos afetos, mas nem por isso precisamos fazer de um ambiente coletivo uma praça de guerra. Não gosta de alguém? Tudo bem, apenas cumprimente e se mostre educado, mas não procure picuinhas para piorar seu dia e também o dessa pessoa. Evite provocações mútuas. Se seu desafeto só tem grosserias no vocabulário, você não precisa ser, necessariamente, igual. Ou precisa? E, além disso, os outros que estão no mesmo ambiente não têm nada com a situação de inimizade existente entre vocês.


Alguns alegam que esquecem a gentileza porque estão atarefados ou a falta de tempo os deixa estressados. Mas, que tempo se perde para cumprimentar alguém, ou pedir de forma gentil que algo seja feito? Pelo contrário, a falta dessa educação é que toma mais tempo, pois aquele que se viu espezinhado ou ofendido, fará tudo de uma forma mais amarga, mais a contragosto. Um mero “por favor”, seguido de um sorriso, pode acelerar muito as coisas. E se for acompanhado de um “agradecido, obrigado, Deus lhe pague, ótimo trabalho”, as portas para sua volta e, consequentemente, uma nova solicitação de alguma coisa, estarão sempre abertas. O exercício da gentileza pode ser demorado, mas rende excelentes frutos. O que muitos esquecem, no entanto, é que para ser tratado de forma agradável, devemos agir assim também. Normalmente, existe uma questão de reciprocidade envolvendo o tratamento. Trate bem, e assim tenderá o retorno da ação.


Fatores como situação financeira, desemprego, estresse, doença, depressão, pressão profissional, entre outros, acarretam uma alteração de humor, e relegam a gentileza e a educação para segundo plano. O engraçado é que acabamos condenando essas pessoas, mesmo sem saber que elas estão com problemas. E muitos de nós, que tanto reclamam, só o que sabem fazer é apontar a situação, mas mostrar uma solução ou tomar uma atitude, isso elas não sabem fazer. Talvez o que elas desconheçam, é que essa solução é a mais simples que se possa imaginar. Basta a iniciativa de sorrir e ser educado. Somente isso.


Muitos entenderam a mensagem, mas para os carrancudos de plantão, aqueles que teimam em achar que o mundo conspira contra eles, vou resumir e falar claramente. Não adianta reclamarmos que não existe mais gentileza e educação no mundo, se nós mesmos esquecemos de tratar os outros dessa forma. Vamos reclamar sim, claro, mas, antes de qualquer outro, nós, que tanto reclamamos, é que devemos dar o bom exemplo.


Tenho certeza de que a gentileza e a educação não irão consertar o mundo, mas, em compensação, o tornarão um lugar muito mais agradável de viver.

sábado, 13 de novembro de 2010

TEM QUE RIR PARA NÃO CHORAR

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Por vezes, nos deparamos com situações que deixam dúvidas. Rimos da besteira vista ou ouvida, ou choramos pela situação, que pode se apresentar de forma infame, ignorante ou esquisita.

No verão passado e com alguns amigos de fora de Curitiba me visitando, fomos até ao zoológico municipal. O local é enorme e demos a sorte de encontrar um outro amigo, formado em zoologia, que nos deu uma verdadeira aula sobre aqueles e outros animais. No decorrer da conversa, esse zoólogo fez referência à quantidade de alimento que se gasta para saciar a fome daqueles animais presos. Foi então que uma das pessoas que me acompanhava, proferiu a seguinte pérola:

--Com tanta criança passando fome, por que dar tanta comida para esses animais?

Confesso que, na hora, fiquei aturdido e mudo. Fiquei imaginando uma dieta para aqueles comilões, afinal, eles pareciam “comer muito”. Talvez estivessem ali por livre e espontânea vontade, então, mereciam ser alimentados? Depois, achei uma solução mais simples, para agradar a gregos e troianos. Por que não contratá-los como funcionários do zoológico? Então, seria dado um bloco de vales-alimentação ou, até mesmo, uma pensão em dinheiro, para esses animais. Assim, eles poderiam ir para algum restaurante ou supermercado, e não tirariam mais a comida dos outros.

Noutra situação, parado numa banca de revistas, numa das ruas mais movimentadas de Curitiba, uma senhora entrou, toda empolada e afoita, reclamando das obras que, basicamente, tomavam toda a calçada. Disse ela:

--É irritante. Por que é que a prefeitura tem que fazer obras como essa, durante o dia?

Caros amigos, essa obra levou umas três semanas para ficar pronta, e exigia escavação. Teria como fazê-la na parte da noite e sumir com ela durante o dia? Obras na cidade, todos querem, mas quando é defronte às suas casas, ou em seu caminho habitual, só o que fazem é reclamar.

Numa outra situação, cômica em seu início, mas depois fatídica, vi alguns machões empalidecerem de susto. Estava conversando com um amigo, numa lanchonete que frequento e tenho um grande circulo de amizades, quando recebi a notícia de que determinada pessoa havia falecido. Conversa vai, conversa vem, e a notícia do falecimento do dito cidadão se espalhou. Como a pessoa era muito querida, muitos se aprontavam para ir ao velório, e assim prestar uma última homenagem. Nisso, notei o dono da lanchonete completamente pálido e olhando para a porta. Quando me voltei para ver o que estava acontecendo, o “falecido” estava entrando, belo e faceiro. Pode parecer mentira, mas alguns aprenderam a rezar ali, na hora.

Mas, o pior dessa história acima, ficou para uma semana após. Voltei até aquela lanchonete, acompanhado de uma pessoa, daquelas que para falar besteira não precisa de lugar específico ou de hora apropriada (se é que isso existe), e recebi, novamente, a notícia do falecimento daquele mesmo indivíduo, mas agora, atestada como verídica. Meu amigo, do nada, comentou:

--Eu, hein! Vou esperar uns dois dias. Vai que o morto desiste da morte, e ressuscita novamente!

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No entanto, a pior história dessa coleção aconteceu dentro de minha própria casa. Minha mãe, uma pessoa que se criou no cabo de uma enxada e que não teve chances de se instruir numa escola, andava reclamando um pouco sobre o fato de todos os habitantes da casa receberem cartas, semanários, cartões ou qualquer outra coisa vindas pelo correio, e ela não. Pode até parecer algo banal para a maioria das pessoas, mas não para ela. No começo, parecia ser tom de brincadeira, porém, com a repetição da reclamação, vi que a coisa era séria. Ela estava se sentido realmente magoada com o fato.

Mas, ela é alguém que não tem conta em banco, não assina jornais ou revistas, não gosta de internet, todas as contas da casa estão no nome do meu pai e toda a comunicação dela com o mundo é feita pessoalmente ou via telefone. Como fazer, então, para que ela recebesse alguma correspondência? E como nada está ruim o suficiente que não possa ficar ainda pior, chegou uma correspondência, em nosso endereço, para minha avó materna, contendo dois cartões de crédito.

Por que piorou tudo? Meu pai foi tutor da minha avó, e por isso a correspondência foi para nosso endereço. Mas, o engraçado é que minha avó materna é falecida já tem mais de dez anos. Resumindo, até morto recebe correspondência, menos minha mãe.

É para rir ou chorar?

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

NADA MAIS DO QUE UMA CRIANÇA

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Há uns vinte anos, aproximadamente, era apenas um local ermo e que ninguém queria. Ali começava o morro, bem na divisa de duas áreas de terra e os lotes eram ruins, chão dobrado e com poucos atrativos. Os anos passaram e uma casa apareceu, depois outra e mais outra, até que um bairro de classe média alta se instalou na parte baixa. O morro também foi habitado, porém, por uma invasão, o que gerou certo receio nos vizinhos mais abastados. Então, como se resolvesse alguma coisa, os moradores da parte baixa construíram um muro imponente, pensando coibir qualquer atitude inesperada ou de “má intenção” da vizinhança de menor sorte.

Sempre observei os contrastes daqueles dois universos completamente díspares, e nunca aceitei muito bem essa situação. Não me refiro à condição de um ter mais dinheiro em relação ao outro, mas a forma de tratamento que esta condição traz. O bairro rico tem todo o atendimento necessário por parte das autoridades, seja ela de qualquer nível ou esfera, enquanto que a parte alta e mais pobre, sofre as mazelas de, muitas vezes, ficar relegada a própria sorte. Descaso governamental ou preconceito daqueles que têm melhores condições? Fazer relação ao fato de se tratar de uma invasão na parte alta, já não mais justifica tal abandono, pois com o tempo, a situação de cada morador foi regularizada. As benfeitorias e o atendimento público para os serviços essenciais até foram instalados no alto do morro, mas a manutenção dos mesmos, quando existe, leva muito tempo para ser considerada efetivada.

Transito, por motivos profissionais ou por ter amigos residentes, nesses dois mundos, e tenho a oportunidade de constatar as mais cruéis situações a que o ser humano pode passar com relação à ingerência na distribuição de renda em nosso país. É certo que, mesmo na parte pobre, existem moradores com um nível social que sequer combina com o lugar, e é difícil entender o porquê da permanência dessas pessoas naquele local. Talvez uma questão de costume, ou, quem sabe, o temor pela não adaptação ou aceitação em outros lugares.

Certa vez, fiquei observando um garoto, de uns doze anos de idade, parado no alto de uma escada, construída de forma improvisada no muro de divisa dos bairros. Ele estava numa plataforma que funcionava como um posto de vigilância, e tinha uma visão privilegiada de todo o bairro de baixo e, também, das duas únicas entradas do morro. O olhar desse menino se mantinha congelado na direção de uma cancha de esportes, localizada na parte baixa. Lá, várias crianças, de idades variadas, se divertiam jogando futebol ou experimentando seus novos brinquedos, que haviam recebido a poucos dias, no Natal. Reparei a feição entristecida daquele garoto, no alto do muro, e tentei imaginar o que passava em sua mente, naquela hora.

Recordei minha própria infância, de menino pobre, e da época de Páscoa. E foi terrível lembrar da segunda-feira, logo após o feriado, quando na escola os outros meninos vinham com todo aquele chocolate que ganhavam de seus familiares, e passavam por mim, num ato de ostentação involuntária. Talvez não existisse maldade naquela ação, mas, é uma coisa que ficou marcada até hoje em minha mente. Lembro que, na época, sempre me perguntava por que eles tinham tudo aquilo e eu me reservava a, unicamente, ficar olhando e passando vontade de provar um mínimo daquele doce. Hoje, adulto e numa situação financeira extremamente mais confortável, ainda não sei se consegui me livrar desse fantasma.

Quando tornei o olhar para aquele menino, notei que ele me encarava, e parecia questionar o mesmo que eu. Por que eles podiam estar lá, com todo aquele conforto, e ele não? Olhamo-nos por alguns instantes, e minha alma pareceu se revoltar, principalmente quando outros garotos, de idade maior, chegaram até ele e entregaram um pequeno pacote plástico, uma embalagem de leite. O menino recebeu aquilo e aguardou que os outros saíssem. Parecia não mais se importar com minha presença, e como se eu não estivesse ali, levou até a boca aquela embalagem plástica e aspirou algo, que não demorei a perceber que era cola de sapateiro. Logo em seguida, foi interrompido por mais duas pessoas, agora adultos. Ele desceu de onde estava, e sumiu com os dois para trás de alguns arbustos. Saí do local e fui para a casa de um amigo, e então, descobri que aquele menino estava naquele local para vigiar a chegada da polícia ou de pessoas estranhas ao lugar e que pudessem levar algum perigo para as ações de um pequeno grupo de tráfico que havia se instalado no lugar recentemente.

Algum tempo depois, poucos meses, voltei ao local e não vi mais aquela plataforma, no alto do muro. A polícia passara por lá e a arrancara, depois de um confronto entre dois grupos de traficantes. O morro estava limpo novamente, sem grupos de comando do tráfico ou do jogo de bicho. Mas, para isso ter acontecido, o preço foi alto. Uma pequena guerra foi deflagrada entre os dois grupos rivais e a polícia precisou intervir de forma áspera, e muitas baixas foram registradas. Entre elas, aquele menino do muro e mais alguns, que agiam sob o comando do tráfico. Todos eles foram executados pelo grupo rival no ato da invasão do morro.

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Hoje, quando passo no local, ainda tenho a impressão de ver aquele menino ali, olhando para o bairro rico e maldizendo a própria sorte. Qual teria sido o destino desse menino, caso o infortúnio não o acometesse desde o berço? Teria sido, talvez, um médico, engenheiro, cientista, político? Ou teria se voltado para o mundo do crime? Quem sabe um religioso, ou um militar atuante em missões de paz ou guerras? O destino dele poderia ter sido qualquer um desses, mas creio que a única coisa que ele queria, naquele dia em que nos encontramos, era ser alguém com poder de escolha sobre sua própria vida, e não viver a mercê de um sistema que impunha a ele a segregação social.

Esse menino usava e vendia drogas, e se necessário, era capaz de atos violentos para defender a própria vida, mas, era somente uma criança, como tantas outras que estão por aí, vivendo uma realidade cruel e que não deveria estar acontecendo. Infelizmente, hoje ele faz parte apenas das estatísticas de morte ocasionadas pelo tráfico de drogas no Brasil. Ou seja, virou só mais um número.

SUA VIDA VALEU A PENA?

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Nascemos para morrer um dia. Esta é a única coisa que se pode afirmar como certa neste mundo. E isto pode acontecer amanhã, daqui um mês, um ano, cem anos. Mas um dia acontecerá. Muitos afirmam que, pouco antes de “partirmos”, assistimos a um pequeno filme de nossas vidas, e ali, constatamos todas as coisas boas e ruins pelas quais passamos ou fomos protagonistas. E nessa hora, vemos se nossa vida, realmente, valeu a pena.

Mas, por que esperar esse momento tão fatídico para fazer um balanço de nossas vidas? Por que não fazer isso de tempos em tempos, apenas para ver se está realmente tudo bem e, ainda melhor, se podemos fazer com que a vida valha ainda mais a pena? Então, mãos a obra.

Procure um lugar tranquilo, longe de barulhos irritantes, pessoas que possam atrapalhar suas divagações, desligue seu celular, enfim, tire alguns minutos para você e seu espírito poderem conversar um pouco e comece, logicamente, do começo. Sua infância. Ela valeu a pena? Você brincou tudo o que tinha direito de brincar? Correu, pulou, se machucou, “roubou frutas”, teve um cachorro, chorou o que pôde? Não? Meu amigo, a infância só passa no corpo, mas a mente e a alma sempre guardam uma criança. Nunca é tarde para fazer algumas estripulias, no bom sentido, claro. Nada pior do que um adulto que não teve uma boa infância. Ou você acha que eu me reprimo quando posso brincar, correr, pular, fazer arte? Sou uma eterna criança, e adoro isso, e não estou nem aí se alguém me taxar de bobo, de inconsequente. Bobo é aquele que não sabe aproveitar a vida, e inconsequente é aquele que, ao não brincar mais, acaba se estressando com a vida.

E a pré-adolescência? Os brinquedos são outros, as descobertas da vida iniciam, alguns começam a paquerar, achamos amigos, os esportes incitam sonhos. Viveu tudo isso? Foi bom? Eu jogo videogame sempre que me dá vontade. Só não abuso nos esportes, pois meu joelho esquerdo não gosta muito. Mas, te garanto, foi a fase da minha vida que mais aproveitei, e se deixei de fazer algo lá atrás, faço agora, só para ter o gosto de ver como é.

A adolescência. Namorar, sair, passear, estudar, namorar, namorar e namorar. Também aparece o primeiro emprego para quem precisa trabalhar. Estudou? Namorou, passeou, curtiu bem? Nem preciso falar, não é? Eu não estudei tudo o que eu queria e estou com quarenta e dois anos, mas pretendo, logo logo, mais alguns cursos, quem sabe uma faculdade também. Aliás, se deixar, passo a vida fazendo isso, pois simplesmente é um vício em minha vida. Namorei pouco, mas diria que foi com muita qualidade, e saí muito, passeei muito. Como curti essa fase. Mas quero mais, ainda existem muitos lugares aos quais quero ir e conhecer. Só o primeiro emprego não foi lá essas coisas, mas consertei depois.

Fase adulta e suas responsabilidades. E nem venha me dizer que não há como se aproveitar bem a vida nesta fase, pois é justamente aqui que mais se aproveita. O casamento, os filhos, a profissão definitiva, a liberdade e o gosto de ter o comando da própria vida, enfim, tantas coisas que esse período nos traz. Até mesmo o divórcio e os recomeços têm lá suas vantagens. Claro que um divórcio não é uma coisa boa, mas dá experiência e não tem que ser, necessariamente, regado à discórdia. Então? Tudo bem nesta etapa da vida? Não? Então, por que não faz algo para melhorar? Já estamos na idade adulta, e, com isso, seu tempo está esvaindo. Aproveite para melhorar agora, porque, se esperar muito, acaba sendo tarde.

Não posso falar muito da próxima e melhor fase, que alguns chamam de terceira idade, outros de melhor idade ou, ainda, de fase idosa. Mas, pode ter certeza de que, se Deus permitir, aproveitarei ao máximo.

Num balanço rápido, brinquei o que pude, aprontei muito, namorei pouco mas sempre foi muito proveitoso, tive bons empregos e em todos me empenhei e fui reconhecido, estudo e me informo desde que entrei numa escola, constitui família, me divorciei mas tenho uma amizade enorme com minha ex-esposa, e, para finalizar, existem duas coisas das quais muito me orgulho. A primeira é o meu namoro com as letras. Escrevo, muito, e escrevo porque gosto. Andei desmotivado, mas foi temporário, e voltei rapidinho e com a corda toda. A segunda, é meu xodó, minha maior contribuição para esse mundo, meu FILHO. Um garotão, que hoje está com 18 anos, e que se transformou num homem inteligente, honesto, carinhoso, companheiro e de um coração enorme. Minha semente para a eternidade está com ele, e tenho certeza de que será muito bem aproveitada.

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Se Deus me chamasse agora, neste exato momento, tenho certeza de que minha vida teria valido, e muito, a pena. Obviamente, iria negociar, pois ainda quero conhecer meus netos, alguns lugares onde ainda não estive, quero ler alguns livros, namorar mais um pouco, se possível ter mais uns filhos... mas a voz de nosso Pai é soberana. Creio que eu partiria sorrindo.

E você? Sua vida está valendo a pena até agora? Não? Então, está esperando o que para melhorar?

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O VÍCIO EM TRABALHO E A ROTINA. ESTRESSE EMINENTE.

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Um periquito assado. Esse foi o motivo do seu divórcio. Um casamento que durou quinze anos, acabou desse jeito, por um simples descuido. Mas, será que foi só por isso?


Rubens era um homem honesto e trabalhador. Bom marido, pai exemplar e dono de uma loja de ferragens, um tanto quanto distante de sua residência, mas nada que uns quarenta minutos no trânsito de uma grande cidade não resolvessem. A loja ia bem e estava prestes a comemorar seu décimo ano de existência. A festa seria grande, com a presença dos fornecedores e familiares dos funcionários. Os maiores e melhores clientes também marcariam presença, assim como uma equipe de filmagens mostraria a história da loja e de seu proprietário. E o Rubens no comando de tudo, tendo na esposa o sustentáculo para todos aqueles anos de empreita. Ela, a esposa, comandava a outra loja, uma filial, mais próxima de casa, mas também estava envolvida até o pescoço com a comemoração.


Durante esses dez anos, a rotina comandou a vida do Rubens. A esposa levantava muito cedo e ia para a academia de ginástica, e depois para a visita aos clientes, num marketing muito dirigido e que era o orgulho do Rubens. Era uma excelente vendedora, e sequer poderia pensar em sair da frente desse departamento. Como as ocupações eram muitas, dividiam as tarefas do lar. Então, todas as manhãs, o Rubens acordava, tomava seu banho e ia para a cozinha. Lavava a pouca louça que ficara do jantar, pois a empregada só aparecia após o almoço, alimentava os cães, colocava o gato para fora de casa, trazia a gaiola do periquito para próximo da janela e, na saída, deixava preparado o lanche das crianças e o colocava num forno elétrico com “timer” preparado para ligar uma hora após sair. Tudo isso era feito de uma forma mecânica, sem prazer algum.


Quando entrava em seu automóvel, Rubens sentia um enorme desânimo. Atravessar todo o centro da cidade era terrível, principalmente naquele horário. Mas, tinha que ser feito, então, ligava o veículo e saia, quase esbarrando na lixeira que seu vizinho colocava sempre ao lado de sua saída. Buzinas para cá, freadas para lá, um motoqueiro, sempre o mesmo nos últimos meses, atravessava seu caminho, aquele policial que insistia em ficar olhando feio a cada vez que ele parava sobre a faixa de pedestres, enfim, essa era parte de sua rotina.


Na loja, a balburdia. O corre-corre dos clientes era sempre o mesmo, com gente entrando e saindo a todos os instantes. Eram pessoas de todos os tipos, mas sempre sobrava para ele os piores, aqueles que queriam algo, mas que não sabiam explicar o que era ou como era o produto. Apenas sabiam que queriam algo e pronto. Ele gostava de atender os grandes clientes, aqueles que compravam muito, e não aqueles pequenos, que só precisavam de um parafuso. Mas, cliente é cliente, ele sempre pensou assim, e não seria agora que atenderia de forma diferenciada apenas pela compra ser menor.


E assim, seu dia passava, mas não aquele dia que ele considerava o ideal, e sim, seu verdadeiro dia. A volta para casa era ainda pior, principalmente quando chovia. Buzinas novamente, todos com pressa, trânsito engarrafado. Era o inferno em plena terra. Durante a noite, jantava, dava um pouco de atenção para os filhos, pois mesmo cansado, jamais negou um sorriso ou afeto para as crianças e a esposa, e desabava no sofá, exausto. Se alguém perguntava, dizia que estava tudo bem e que logo “aquela bendita festa” passaria e ele estaria melhor. E a festa veio e passou, mas o Rubens continuou o mesmo.


Os fins de semana vinham e iam, e nada do Rubens se animar. Praia, campo, nada o animava.


Numa determinada manhã, ao acordar, trancou o gato no chuveiro, jogou toda a louça para fora de casa e prendeu o periquito no forno e preparou o “timer”. Ao sair de casa, engatou a ré do veículo e, deliberadamente, atropelou a lixeira do vizinho. No trânsito, quando viu aquele motoqueiro que sempre o ultrapassava, jogou seu carro para a esquerda e o prensou contra um ônibus, quase causando um acidente de grandes proporções. Não satisfeito, parou sobre a faixa de pedestres e, quando o policial se aproximou, aproveitou e fez alguns gestos obscenos para ele e pisou no acelerador, fazendo com que outros veículos freassem bruscamente para não colidirem.


Na loja, mandou que todos fossem para casa e baixou as portas. Ninguém entendeu nada, mas, afinal, ele era o patrão. Tempos depois, umas três horas, atendeu ao telefone e identificou no ato a voz da esposa, nervosa. Sua casa estava em chamas. O motivo? O plug da tomada do forno, que estava para ser trocada fazia alguns meses, não aguentou o tempo de uso contínuo, as duas horas de timer que ele havia pré-programado para assar o periquito, e entrou em curto-circuito, ocasionando um incêndio. Ao chegar em casa e ser cobrado para dar explicações, não suportou e agrediu um dos bombeiros, que atendia seus filhos na porta de uma ambulância. Foi preso em plena agressão.


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Rubens era uma boa pessoa, um bom marido e um pai exemplar, mas era um “workaholic”, um viciado em trabalho. Mesmo dando atenção ao lar, à esposa e aos filhos, sempre colocou seu trabalho antes de tudo, e sequer notou que o fato de ser absorvido demasiadamente pelos afazeres profissionais, além da rotina e do estresse do dia-a-dia, estavam minando sua saúde. Então, sem aguentar mais, seu estado emocional “explodiu”.


Mesmo sem ser um “workaholic”, muitas pessoas desenvolvem uma rotina desgastante, e quando se dão conta, notam que estão com um grau de estresse muito elevado. São pessoas que não são capazes de ver beleza em nada além daquilo que lhes é comum ao seu percurso diário ou aos seus afazeres. Simplesmente, levam uma vida mecânica.


O que custa desviar, de vez em quando, o caminho para o trabalho, evitando assim os mesmos congestionamentos, as irritantes buzinas ou os estressados de sempre no trânsito? Meros minutos que você venha a perder, podem trazer novos ares, coisas diferentes para serem vistas. E no trabalho, pode-se mudar de setor, de tarefas, fazer coisas diferentes, variar um pouco. Nenhum patrão quer ter o seu funcionário afastado por motivos de estresse, e se ele não der ouvidos, acabará pagando por isso, pois poderá perder um funcionário por algum tempo ou, o que é pior, definitivamente.


Em casa, a história é outra, pois ali é que a rotina aperta de vez. E a tarefa de minimizar essa questão é de todos que residem sob o mesmo teto. Ao invés da televisão, por que não ir a um cinema ou teatro? Ou um bom livro? Que tal levar a família para jantar fora? Um passeio em conjunto? E nada de trabalhar no final de semana, pois sequer Deus trabalhou os sete dias. Faça algo diferente nos fins de semana, invente algo, crie alguma alternativa ao que é feito rotineiramente. Mas saia da mesmice.


E nem venha com aquela história de que o mundo é chato e sua vida está uma droga, pois isso é discurso de pessimista e derrotado. A vida é boa e o mundo é lindo. Tem muita coisa por aí para ser feita e aproveitada. Mas, claro, se você acha que o trabalho e a rotina são mais importantes, tudo bem. A depressão e o enfarte também propiciam uma excelente rotina, após acometerem alguém. A rotina dos remédios e tratamentos caros e demorados. Mas você adora a rotina, não é?

terça-feira, 9 de novembro de 2010

VIDA EM FAMÍLIA

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O convívio familiar é algo complexo. Deus não nos colocou na terra para vivermos feito ilha, isolados, mas bem que Ele poderia ter deixado um manual de “instruções rápidas”, para sanar eventuais danos ou incêndios que, teimosamente, aparecem de tempos em tempos. Há que se saber como comandar, ou melhor, como determinar a harmonia dentro de um lar nos dias de hoje. Aqui em casa, depois de uma leve discussão entre meus pais, acordei pela manhã e encontrei sobre a mesa uma belíssima torta de frango, que minha mãe fez após aquela rusga que manteve com meu pai, ontem à noite. Mas essa questão da torta, explico mais tarde.

Todo começo de relacionamento é maravilhoso, onde o mundo adquire mais cores, os pássaros cantam de forma mais bela, pequenos defeitos de personalidade são relevados e os planos são os mais variados possíveis e feitos em conjunto. Depois de alguns anos de casamento, o tubo de imagem da vida estraga e parece que tudo fica em preto e branco, nas árvores só aparecem arapongas, a personalidade já nem existem mais, e aqueles planos lá do começo, viraram planos de saúde, plano funeral, planos de divórcio e por aí vai. Deveria ser assim?

Não quero abordar o lado psicológico do relacionamento um casal, mas o cotidiano leva claramente a um desgaste no relacionamento. Tenho escutado muitas pessoas, de gerações anteriores a minha, dizendo que “ah, no meu tempo, os casais se respeitavam mais, e o casamento era levado de um jeito mais sério”. Até concordo com esta afirmação, mas também havia um machismo predominante, e a pobre da mulher não tinha voz ativa para nada. As mães criavam as filhas única e exclusivamente para atender ao marido e aos seus caprichos. Isso era uma vida em família? Já com o passar dos anos e a conquista de direitos por parte das mulheres, a situação ficou bem diferente, tanto que hoje é bem comum encontrá-las chefiando um grupo familiar ou, em muitos casos, mantendo sozinhas um lar.

Num grupo familiar comum, composto de pai, mãe e filhos, a ordem da vez é “primeiro eu, isso é meu, não me encha o saco”. Não digo que em todas as famílias impere este sistema, mas em várias, sequer um bom-dia é dado pela manhã, e quando se vê, já existe briga diante do banheiro para ver quem irá usar o chuveiro primeiro. Nas refeições, cada um pega seu prato e desaparece para algum canto da casa, e quando se tem algo sério para ser dito, sobre algum assunto íntimo do lar, isso é feito diante do computador, e o pior, algumas vezes com estranhos. A falta de diálogo é o que mais preenche uma casa, e sempre que perguntado o motivo, as palavras cansaço, falta de tempo, stresse e falta de assunto, vêm à baila.

As brigas também se tornaram mais constantes, e em muitas vezes, são motivadas pelos filhos e sua rebelde juventude. Neste ponto, a família ao modo antigo era perfeita, onde os filhos respeitavam muito mais a hierarquia familiar. Além deste fator, ainda existem os gastos excessivos e desnecessários por parte dos cônjuges ou dos rebentos, a falta de respeito pelo espaço alheio, as “saídas” com os amigos, o futebol, a novela, a fofoca, a traição, a falta de Deus, enfim, motivos que dariam para encher todo um universo mas que, se pararmos para pensar, acabamos voltando num ponto básico: falta de diálogo e respeito mútuo.

Os conselhos vindos de fora da família também são muito complicados. Antes de conversar entre si e tentar esclarecer o que não está bem, o casal adquiriu o péssimo hábito de se aconselhar com amigos ou parentes que, na maioria das vezes, sequer sabe o que está acontecendo dentro daquela família ou, ainda pior, não nutre um sentimento muito bom quanto àquele que está sendo “condenado” no momento. O resultado disso, na maioria das vezes, é a separação do casal, pois os conselhos que aparecem são sempre dados sem um embasamento factual, ficando unicamente no lado emotivo da situação, o que acaba sendo tendencioso.

Algumas pessoas são perigosas na hora de dar conselhos. Conheço uma senhora que, ao saber das rusgas que um casal de vizinhos promovia constantemente e, claro, pendendo para o lado da vizinha, orientou a ela que, ao ocorrer tal fato, atacasse o marido com unhas e dentes. A vizinha levou aquilo tão a sério, que uma semana depois o vizinho apareceu com a barriga mordida e vários arranhões pelo rosto. Quase se separaram. Em outra oportunidade, esta mesma senhora se viu diante de um casal que vivia brigando por motivos de bebedeira do marido, e deu o seguinte conselho para a esposa: “se ele beber e ficar muito chato, quebre o que você achar pela frente”. Ao fim de tudo, e de vários pontos na cabeça do infeliz (ela quebrou uma garrafa e a cabeça do marido em conjunto) a moça acabou parando numa delegacia.

Nem todos estão preparados para um convívio familiar, e quando a família se forma, é necessário um cuidado redobrado no trato aos filhos, pois será em pai e mãe que a criança se espelhará e irá retirar os elementos necessários para compor seu caráter e, lá na frente, formar sua própria família. E quanto a dar conselhos, honestamente, se você não é frequentador(a) assíduo(a) daquele lar ou tem alguma diferença que impeça um bom convívio com um dos cônjuges, não dê “pitaco” nas brigas deste casal. Não julgue dizendo “homem nenhum presta,  mulher é assim mesmo”, pois isto pode ser uma das maiores irresponsabilidades vindas de alguém. Taxar ou condenar uma pessoa, sem antes ouvir o que ela tem a dizer, é um ato de covardia, e você poderá promover a dissolução de uma família. Portanto, pense muito bem antes de sair por aí querendo bancar o(a) conselheiro(a) sentimental.

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Quanto aquela torta de frango lá do começo, bem... a discussão foi leve, mas os ânimos continuavam exaltados, e meu pai detesta torta de frango, além de ser alérgico ao dito animal. Pelo visto, mais encrencas pela frente.