segunda-feira, 30 de maio de 2011

NEM SÓ DE WEB VIVE O HOMEM

Chocolate Laka / image by Google
Realmente, não vivemos só de internet, mas é nela que temos a chance de buscar muita coisa que ficou para trás, e que em décadas passadas, jamais teríamos acesso.

Meus dias têm sido muito atribulados, sem tempo sequer para respirar por vezes. Mas, como ninguém é de ferro, em alguns momentos tiro umas “horinhas” para repousar a cabeça. Num desses momentos, e fazendo uma seção nostalgia, garimpei duas preciosidades do meu passado.

Abaixo estão dois vídeos que mostram como as coisas boas passam e, se não cuidarmos, esquecemos rapidinho.

Martin Lawrence e Tim Robbins
image by ADORO CINEMA
Este primeiro vídeo mostra uma cena do filme NADA A PERDER (Nothing to Lose) lançado originalmente em 1997. Nele aparecem os atores Martim Lawrence e Tim Robbins numa das cenas que mais me fizeram rir. Desde que reencontrei este vídeo, assisto-o no mínimo 10 vezes por dia. A cena, além de hilária, mostra como os atores realmente incorporaram o papel, e se divertiram com ele. Sem contar a música, que casou perfeitamente com a cena.

Filme NOTHING TO LOSE / video by YouTube

Mais informações sobre o filme: ADORO CINEMA.

O segundo vídeo é um dos clássicos da publicidade brasileira, o comercial LAKA – ME DÁ UM BEIJO, de 1987. O interessante aqui, além do trabalho muito bem elaborado pela equipe publicitária, é o resgate de uma das pérolas (opinião minha) da música romântica internacional. Muitos pensam que a balada “Crying in the Rain” é do grupo A-HA, mas eles apenas re-gravaram a música (1991). Ela foi lançada originalmente pela dupla THE EVERLY BROTHERS, no ano de 1961.

Propaganda do chocolate LAKA / video by YouTube

Nos players abaixo, a versão completa das duas músicas apresentadas nos vídeos.



Scatman John - Scatman / by YouTube



The Everly Brothers - Crying in the Rain / by YouTube
(especialmente para ILY, com todo meu amor)



Para os curiosos ou saudosistas, uma foto da dupla The Everly Brothers:

image by Google


Marcio JR

segunda-feira, 23 de maio de 2011

AMOR ETERNO

image by Google
A manhã da sol se mostrava linda naquele jardim. Pássaros e abelhas voavam e mostravam a alegria de estarem ali, numa comunhão entre amor e natureza. Eu caminhava lento, ladeando aquelas flores tão bem cuidadas, e levava pelas mãos a minha amada companheira. Estávamos velhos, sem aquele vigor da juventude, mas andávamos ali, lado a lado naquele jardim. Construímos toda uma vida ali, e aprendemos que aquele jardim não teria sentido se não pudéssemos andar assim, um ao lado do outro.

image by Google
Eu olhava minha amada, seus doces olhos, seu sorriso. Nunca deixamos, em todos os nossos momentos, de nos beijarmos pela manhã e de refazer nossos votos de amor eterno. E o resultado de nosso amor estava ali, do outro lado daquelas flores: nossos filhos, nossos lindos filhos, cada um deles com seus filhos também. Nossa filha, tão bela quanto a mãe, e tão sapeca também, e nosso filho, homem forte, vigoroso, mas bondoso e sensível, chorão igual ao pai, eram nossas razões de viver. E os dois, iguais a nós, sempre apaixonados pela vida.

Minha amada caminhou para o outro lado, e ficou me esperando, tão serena, tão linda. Seu coração pulsava forte, me chamando, e eu, sempre apaixonado, fui até ela e a abracei, como fiz por anos sempre que algo me entristecia ou me alegrava, ou então quando estávamos próximos, só pelo gosto de estarmos juntos. E nunca, em dia algum, deixei de agradecer por tê-la encontrado, tê-la conhecido e por ela ter-me aceitado como sou. Tanto aprendemos juntos, choramos juntos, amamos juntos. E ensinamos tudo isso para nossos filhos, que ensinarão aos seus também.

Paraíso / image by Google
A perfeição nunca foi nosso objetivo, e nossos defeitos nos ajudaram a conhecer melhor um ao outro. Caminhamos, eu e ela, para o portão e paramos, num último olhar para nossos filhos. Choramos então, os dois, e os abençoamos. Eles sorriram, talvez pela pirraça que os pássaros faziam, mas sabíamos que aqueles sorrisos eram para nós. Não haveria adeus, apenas um “até breve”. E sorrimos também, seguindo nosso caminho para a vida eterna. Deus nos deu algo muito maior do que qualquer sentimento, e mesmo depois que deixamos esse mundo, que fizemos essa travessia que alguns temem, continuamos nos amando por toda a eternidade.

Marcio JR

sábado, 14 de maio de 2011

CHICO CONTENTE – MATUTO SIM, BURRO JAMAIS.

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Aquele final de manhã de sábado teria tudo para ser normal. Pleno outono, de um mês de abril lá na década de 30. O lugar? Piracicaba.

Algumas pessoas caminhavam tranquilas pela rua, e se cumprimentavam naquela prática muito mais gentil do que obrigatória, originária de uma educação que já não existe mais. Os homens tiravam seus chapéus em reverência, e as mulheres curvavam a cabeça, em agradecimento. Mais adiante, no armazém de seu Anésio, alguns fregueses faziam suas compras e aproveitavam para por as conversas em dia, mas não desgrudavam a atenção da estrada.

--Ixe! Lá vem o Chico Contente di novo, cum mais uma carroçada di galinha. Oh! Anésio, qui é qui esse porquêra tá puxano esses frangote a manhã toda, sô?

--Puis óie! Tumem tô c’os bicho carpintero atentado, homi! Vô dá um brado pr’ele vir ter uns dedo di prosa aqui.

E lá foi seu Anésio, cercar o Chico. O matuto, assim que viu o dono do armazém chamando-o, ordenou ao rapaz que o acompanhava a seguir na jornada, e desceu da carroça, ganhando o rumo do armazém. Ao entrar, foi para o balcão e cumprimentou a todos apenas com um gesto de cabeça.

--Chico, tudas as pessoa tão matutano aqui. --comentou o dono do armazém, enquanto servia uma dose de cachaça ao recém chegado. --U qui é tuda essa galinhada qui ocê tá puxano a manhã interinha, hómi?

O Chico virou o rosto de lado e deu uma cuspidela no chão, quase acertando o pé de outra pessoa que estava ao seu lado. A pessoa, por sua vez, deu um pequeno salto, chegando mais para o lado. E o Chico, ao se voltar para o outro lado, apenas mirou o chão e fez menção de repetir o gesto, mas não foi necessário terminá-lo, pois aquele que estava ali tratou de se afastar imediatamente.

image by Google
--Puis, óie. Pareceu lá nu sítio, um ingomadinho lá das banda de Itú, cuma proposta vantajosa pur dí mais. Metade da minha tropa di mula por uma baita popriedade di terra, coisa di virá a cabeça di quarqué um.

--Eita! --seu Anésio se interessou no assunto, mas se mostrou preocupado. --Conta miór isso daí, qui to achano qui tem arapuca nissu tudo. Ondi qui é essa tar popriedade, sô? É nos arredor nosso daqui di Piracicaba?

--Mais, seu Anésio, num é qui num é? É um lote prás banda do céu! --Chico arrematou de forma tranquila. --Um baita terrenão, cum iscritura i tudo. I o abestado do moço inda levô minhas pior mula.

Todos os que estavam no armazém ficaram estarrecidos. Mas, foi seu Anésio quem ficou mais irritado com o que ouviu.

--Chico, seu burro! Cumé qui vóis micê mi entra numa lorota dessas, hómi? Num tá vêno qui isso é tramóia? Esses larápio vêm aqui i passa a perna ni nóis, i adespois sai pur aí ispaiano qui nóis é tapado i burro, i tudo acurpado são ocêis, qui si apinxam no conto do vigário. Será qui só eu qui tenho miolo nesses arredor? Pur pura sorte, meu pai mi insino a se isperto i eu passo isso pru meu fio, que virô sitiante dos bão.

--Carma, seu Anésio. --um dos clientes falou ao comerciante, como se desconfiasse que ainda havia mais coisa a ser contada. --Dexa o Chico caba a história, ara!

--Dexo, nada! --seu Anésio continuou em sua irritação. --Esse daí é pur dimais gaiato, mais é burro inguar as mula dele. Mais vá, trimina logo essa história, qui adespois, vô lá contá pru meu pai a ingomada qui ti déro. I tem mais. Quí é qui essas galinha tem cum tudo isso?

--Bão. --Chico coçou o queixo e tomou um gole de sua cachaça, estendendo o copo como se pedisse mais uma dose. --Matutei qui matutei, i achei qui aquilo tudo era muita terra pra ieu suzinho, i vindi a metade. Cumo pagamento, aceitei essas quinhentas galinha, qui vale muito mais du qui aquelas déiz mula véia que gastei no negócio.

mula / image by Google
--Mais ieu to falano! --seu Anésio bufava, ainda mais irritado. --Ocêis num vale o ar qui arrespira. Seus asno. Será qui só vai restá ieu i minha famía cum miolo pur aqui? Quem foi o miolo móle qui vóis micê inrolo nessa presepada?

--Óia. --completamente calmo, Chico se despediu de todos com um aceno de cabeça e foi na direção da porta. De lá, olhou para trás e encarou seu Anésio diretamente nos olhos. --A metadi ieu vendi pro Quinzinho, vosso fio, na troca das galinha. Mais dona Matirde, vossa mãe, já mando mi avisá qui o cumpadi Heitor, vosso pai, tá mi percurano prá módi nóis negociá o restante. Mi parece qui ele qué investi num miarar celeste, i já qué mi incomenda inté as semente. Quem sabi, nóis num negoceia as mula qui mi restô prá puxá a safra celeste tumem?



Marcio JR

sexta-feira, 13 de maio de 2011

TRAVESSURAS DA LOIRINHA: TUDO CULPA DO MACACO


image by Google
 --Oh! Paiêêêê! --a loirinha gritou, correndo pelo jardim e já quase entrando em casa, praticamente arrastando uma amiguinha pelo braço. --Cadê aquele teu pincel nuclear?

--Calma, filha. Não corra dentro de casa, ou você pode se machucar. --E não é pincel nuclear, e sim, pincel atômico. Está lá na biblioteca. Mas, por que você precisa dele?

--Tem um monte de brincadeiras “lesgais” no blog do Xipan... e eu quero brincar também. Já brincamos de montão lá na casa da Clarinha. Deixa a gente brincar aqui também? Deixa, vai? Diz que sim, diz que sim. Diiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiz!

--Claro. Mas quem é esse tal Xipan? E o que é “lesgal”?

--Depois te conto. Vamos, Clarinha. Dá pra usar o computador da biblioteca.

O pai apenas balançou a cabeça e sorriu. Lembrou de sua infância, e de como eram boas as brincadeiras sem os artifícios eletrônicos, mas, como ele sempre dizia, “o tempo passa, então, acostume-se a ele”.

Algum tempo depois, as meninas corriam novamente pelos corredores da casa. O pai interrompeu a leitura de um jornal e chamou a atenção das meninas.

--Não corram dentro de casa, crianças. Já cansaram das brincadeiras no tal blog do Xipan?

--Nada, pai. O macaco é show. Mas é que o computador da biblioteca tá ruim. Vamos usar o do meu quarto.

--O computador da biblioteca tá ruim? Como assim, se ele é novinho? E que história é essa do Xipan ser um macaco?

As meninas sequer prestaram atenção ao pai, e sumiram pelo corredor. Mas não demorou muito tempo, e elas estavam em algazarra novamente, só que agora, no segundo andar da casa.

--Oh! Papito querido. Não se preocupa não, que só estamos trocando de computador. Vamos pegar o “notebuque” da mamãe, tá bom?

O pai, absorto na leitura do jornal, pouco deu atenção, mas estranhou quando, um pouco mais tarde, as meninas passavam por ele e se dirigiam para a pequena marcenaria que ele mantinha nos fundos de casa. Nas mãos da loirinha, o tal pincel atômico.

Algo estava acontecendo, e a curiosidade o fez largar o jornal e seguir as meninas, apenas por garantia. E lá foi ele, pisando macio para não fazer nenhum barulho, até que chegou ao puxado, nos fundos da casa. Lá, as meninas faziam farra diante do computador, e ao que tudo indicava, utilizavam aquela dita caneta para escrever diretamente na tela do aparelho.

--Mas, o que é que vocês duas estão fazendo, afinal? --o pai perguntou, fazendo ares de descontente.

--Ué! –a loirinha deu de ombros, voltando-se para o pai. --Joguinho dos sete erros do blog do Xipan Zeca, papai.

image by Google
--Mas, mas, mas... vocês estão riscando toda a tela do meu notebook! Por que não imprimiram esse negócio?

--Era prá imprimir o "gonócio"? Ops! --um sorriso amarelado apareceu nos lábios da loirinha. --Será que o papai vai ficar muito brabo quando descobrir que já fizemos liga-ponto, caça-palavras, labirinto e pintamos o macaquinho nos outros computadores? Mas, olha papi, é tudo culpa do Xipan. Quem manda ele não escrever lá no blog que era para imprimir as "bagacinha"?

--Essa menina sozinha, já é um suplício. E agora, arranja um macaco para ajudar a dar idéias? --o pai desanimou, deixando cair os ombros. --O mundo tá perdido. 

Marcio JR

terça-feira, 10 de maio de 2011

MUITO ALÉM DE UM OLHAR

Jesus e as Crianças / image by Google
Conta a lenda, que quando Jesus andou na terra, ele foi convidado a ir até um vilarejo muito rico. Lá, todos queriam a salvação, e pensavam que agradando a Jesus, eles conseguiriam uma passagem para o reino de Deus.

Jesus aceitou o convite, e iniciou sua caminhada até o vilarejo. A pessoa que o convidou se apressou e correu na frente, montado em seu belo cavalo, para preparar uma grande festa. Levaria alguns dias para que Jesus chegasse até lá, e a comemoração em homenagem a ele deveria ser a maior já vista. E assim foi feito.

Vários escravos foram trazidos de todos cantos, muitos cabritos recheavam espetos e panelas, outros ficaram guardados para sacrifício, e as donzelas acabaram retiradas para seus lares e trancadas, para que Jesus pudesse escolher uma delas para desposar. Enfim, tudo estava preparado para a satisfação do salvador daquelas almas.

Quando finalmente o grande dia chegou, todos estavam afoitos. Esperavam ansiosamente pela entrada do Mestre pelos portões da aldeia. Mas ele não chegava. Mandaram que batedores verificassem o caminho, e nada. E foram todos para os portões do vilarejo. Então, sem que eles se apercebessem, alguém vindo de dentro da vila chamou-os.

--O que vocês tanto esperam? Por que a ansiedade?

Todos olharam para trás, e se surpreenderam ao reparar que aquele que os chamava era, justamente, Jesus. Correram até ele, cercaram-no e caíram de joelhos. Alguns trouxeram pão e vinho, e os mais afoitos já carregavam até as filhas para entregar ao Mestre.

--Parem com tudo isso. --Jesus ordenou, afastando-se. --Vocês querem salvar suas almas dessa forma, comprando o perdão? Passei entre vocês, vestido de mendigo, e quase ninguém me viu. Só ligam para a ganância que carregam nos olhos.

--Mas, senhor. Se estava disfarçado, como poderíamos vê-lo? E quem o reconheceu, afinal?

Jesus se afastou um pouco e puxou para perto de si uma menina, muito nova e com trajes rasgados e sujos.

Jesus e as Crianças / by Google
--Senhor, isso é impossível! --um dos aldeões se indignou, chegando mais próximo do Mestre. --Essa menina, além de escrava, é cega!

--Sim, ela é uma escrava, e também cega. Mas ela não me viu com os olhos do rosto, ela me enxergou com o coração. E quando me aproximei, ela me acolheu de imediato, mesmo eu me vestindo de mendigo, e dividiu comigo as únicas coisas que tinha dela própria. Algo que, pelo que vejo, falta a todos vocês e os afasta cada vez mais do Pai.

--Mas o que uma escrava pode ter que seja dela mesma, e que nós não temos?

Jesus, naquele momento, puxou a menina para perto de si e colocou a mão sobre a cabeça dela. Ficou assim alguns instantes e depois olhou um por um daqueles que o cercavam, até que falou:

--Ela tem algo que ninguém pode retirar, seja pela escravidão ou pela cegueira. Ela tem amor no coração e humildade.



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música: Ciclo Sem Fim / Tema do filme O REI LEÃO
Um presente para uma GUERREIRA
FLÁVIA



Este texto é dedicado a alguém muito especial, uma menina de 14 anos, e que perdeu a visão em 2008. O nome dela é FLAVIA, e a história dela chegou até mim faz pouco tempo, através de uma amiga blogueira, chamada Otília (blog DE MÃE PARA MÃE).

Não conheço a FLÁVIA, mas adquiri por ela uma grande afeição. Ela é batalhadora, e mesmo tendo tudo para se entristecer, ainda sorri, e não perdeu as esperanças de, um dia, voltar a enxergar. Para aqueles que quiserem conhecer um pouco mais da história dela, basta clicar neste link (FLÁVIA..MEU NOVO E DOCE APRENDIZADO!!! ).

Se estivesse diante dela agora, creio que não diria absolutamente nada. Sorriria para ela, e acho que algumas lágrimas correriam. Mas falaria sim, através do coração, porque sei que o coraçãozinho dela vê tudo o que se passa a sua volta.

Peço àqueles que passarem por aqui hoje, que não deixem abraços ou beijos para mim, mas sim para ela, que merece todos os abraços e beijos do mundo. 


Deixe, se quiser, um recadinho para a Flávia, pois tenho certeza de que alguém irá ler para ela, não é OTÍLIA?


Marcio JR

domingo, 8 de maio de 2011

RETALHOS

Geada em Curitiba / image by Google
Existem três coisas que geram um fascínio automático em minha mente: um sorriso qualquer pela manhã, um par de olhos curiosos e a palavra “saudade”. 

Era um inverno rigoroso, e minha mãe, que sempre gostou de acordar antes do sol nascer, me chamava muito cedo para ir à escola. Não era muito longe de casa e, após o parco café da manhã, saíamos eu e minha irmã, cada um com seus poucos cadernos e com as mínimas roupas de frio que tínhamos. O calçado fino me faz lembrar até hoje do chão gelado e da sensação horrível e dolorosa que isso trazia. Essas lembranças faziam par com o vento frio que nos cortava o rosto, resultante das geadas que deixavam tudo branco e com um aspecto belo, mesmo sendo terrível de se aguentar. No meio da caminhada, surgiam do horizonte aqueles filetes de sol, que mais pareciam mágicos, misturando-se ao vapor que saia de nossas bocas quando respirávamos. Adiante, mais e mais crianças se juntavam a nós, e ao nos darmos conta, éramos muitos.

image by Google
Próximo à escola, sempre reparava uma senhora, já bem velha, sentada numa cadeira, quase fora de seu portão. Ela pouco se importava com o frio, e durante anos esteve ali, com sua face amarrotada e castigada pelo tempo. Seu cabelo estava sempre preso, e era esplendidamente branco, um verdadeiro algodão. Quando passávamos, ela nos mirava, calma, e nos seguia apenas com aquele par de olhos curiosos. Ela sabia que na volta, passaríamos por ali e, como se ela não soubesse, pegaríamos escondidos algumas frutas de seu pomar. Ela sempre via, mas nunca nos reprimiu ou negou uma daquelas frutas.

Pessegueiro / image by Google
Hoje, ao passar nesse mesmo lugar, a nostalgia me tomou. Senti saudades daquele frio nos pés, por mais cortante que ele fosse, e dos raios de sol secando o orvalho ou derretendo a geada. As árvores frutíferas não estão mais lá, sequer a casa está. Fiquei lá parado por alguns minutos, observando, até que veio em minha mente uma imagem daquela senhora. Lá estava ela, novamente, me olhando com aquele par de olhos curiosos. E é engraçado, pois foi somente hoje que lembrei da única vez em que a vi sorrindo. Foi numa manhã, a única em que fui à escola sozinho. Ao passar naquele lugar, ela mirou-me diretamente nos olhos e soltou aquele singelo sorriso. E então, naquela mesma noite, ela se foi.

Muita coisa aconteceu desde então, coisas boas e ruins. Mas é engraçado que são coisas tão simples, como essas acima, que nos marcam por toda uma vida.



Marcio JR

sexta-feira, 6 de maio de 2011

TRAVESSURAS DA LOIRINHA: NO AÇOUGUE

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Gerosina, a cozinheira e também babá da loirinha, parou o carrinho de compras diante do balcão do açougue e fez seu pedido ao atendente. A loirinha, que a acompanhava, chegou bem próxima ao vidro e ficou olhando um grande pedaço de alcatra, até que foi interrompida pela babá.

--Mocinha, vou pegar alguns ovos. Fica aqui e cuida do nosso carrinho de compras. Não vai aprontar nada, e também não fica colocando produtos no carrinho sem eu saber, hein?

--Xá cum eu, Balduína. --a loirinha respondeu de pronto, tentando irritar a babá.

--Meu nome é Gerosina, trem de menina! E não é “xá cum eu”. Que mania de falar errado. O certo é “deixa com eu”.

Um dos atendentes do açougue, que estava próximo, ao ouvir o que a empregada falou, balançou negativamente a cabeça e olhou para a loirinha, que havia se voltado para o balcão refrigerado novamente. Ele já conhecia a menina, e sabia que a qualquer momento, ela poderia aprontar das suas.

--Oh! Moço. Você gosta de animais? De onde vem essa carne aqui? --a lorinha perguntou despretensiosamente, sem desgrudar os olhos do balcão refrigerado.

Um nó desceu pela garganta do rapaz. Tinha filhos, e sabia que crianças se impressionam com facilidade. Portanto, a resposta correta poderia traumatizar aquela menina. Então, improvisou.

--Ora! --disse ele, se abaixando bem próximo a ela. --Esses pedaços de carne vêm bem de longe, de um lugar que tem muitos duendes.

--Lá do Pólo Norte? --a loirinha se mostrou interessada no assunto.

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--Isso, lá da terra do Papai Noel. Eles fabricam por lá e mandam para cá, para que possamos vender sem machucar nenhum animalzinho.

--Ah! Tá bom. Que legal. --a menina concordou, parecendo ter perdido o interesse sobre aquilo tudo.

A babá se aproximou e cumprimentou o atendente, pegando em seguida a sua encomenda, que já estava sobre o balcão.

--Vamos, mocinha? --a babá perguntou, começando a empurrar o carrinho de compras.

Mais adiante, a loirinha parou no meio do corredor do supermercado e puxou a babá pela roupa, olhando-a interrogativamente.

--Gerosina, o tio do açougue disse que são os duendes do Papai Noel que fabricam a carne que tem aqui no mercado, e que nenhum animalzinho fica dodói por isso.

A babá não entendeu direito o propósito daquilo, mas ficou sem ação, e simplesmente concordou com tudo, aumentando e piorando ainda mais a explicação.

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--Isso, e depois do Natal, o Papai Noel contrata uns caminhões alados para fazer a entrega, e nenhum bichinho sofre "nadica" de nada.

--Que engraçado. --a loirinha olhou a babá diretamente nos olhos, e com aquele ar de deboche que só ela tem. --Vi na CNN um programa que mostrava como os fazendeiros e os açougueiros faziam para matar os boizinhos, e como eles cortavam cada pedacinho que vem aqui para o supermercado. Por que é que vocês acham que todas as crianças são tontas?



Marcio JR

terça-feira, 3 de maio de 2011

FÁBULA DAS PÉROLAS

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Certa vez, num reino da fantasia muito, muito distante, nasceu uma menininha de nome Pérola. Essa menininha crescia e brincava como todas as outras crianças, mas ela era especial, pois sua lágrima era brilhante. Num certo dia, um bruxo mal mandou sequestrar a menina, pensando que suas lágrimas fossem mágicas. Mas a menininha fugiu e se escondeu, deixando o bruxo muito zangado. Ele, então, exigiu que lhe fosse trazido a mãe da pequena Pérola, e assim foi feito. Pérola, depois disso, nunca mais viu sua mãe.

A pequena menina sempre perguntava para o pai onde sua mãe estava, e ele dizia que a mãe havia se transformado em duas pequenas pérolas, e que estas moravam nos olhos da menina. Num certo dia, à beira mar, Pérola achou duas conchas amareladas, e dentro de cada uma, havia uma pérola azul, muito rara. A notícia correu por todos os lados, o que atiçou a ganância de muitas pessoas. Pérola, que sempre ouvira do pai que sua mãe teria virado pequenas pérolas, guardava aquelas jóias como se elas fossem sua própria mãe.

Com o passar dos anos, Pérola virou uma mulher muito bela e cortejada por vários rapazes. Mas todos só se aproximavam dela por ganância. Ora queriam as pedras preciosas que ela carregava, ora queriam suas lágrimas brilhantes, por acharem se tratar de uma poção mágica. Fizeram, então, uma grande festa, e ali Pérola iria decidir com qual dos pretendentes se casaria. Ela, para escolher, fez uma única pergunta a todos, e aquele que acertasse, teria sua mão.

--O que eu tenho de mais precioso? --Pérola perguntou, olhando para todos os jovens ali presentes.

Obteve apenas duas respostas, as pérolas azuis e suas lágrimas.

Pérola não conteve sua irritação e jogou as duas jóias azuis ao chão.

--Vejam o que faço com essas pedras!

Num ato de desespero, pisou sobre elas, esmagando-as.

--Mas, por que fez isso? São jóias raras, e sua mãe pode estar morando dentro delas!

--Vocês estão loucos? --Pérola respondeu, ainda mais irritada. --Minha mãe nunca morou nestas pedras. São apenas pérolas tingidas, iguais a todas as outras.

Aqueles que responderam que seriam as lágrimas, começaram a comemorar, mas foram contidos pela moça.

--E tampouco são minhas lágrimas. Elas nunca foram mágicas, apenas são carregadas com meu suor, têm mais sal. E estou cansada de tudo isso. Vou arrancar meus olhos. Assim, ninguém mais me perseguirá por isso também.

Pérola levou os dedos aos próprios olhos e estava por arrancá-los, quando ouviu outro rapaz gritar.

--Seu coração, bela moça!

Pérola parou o que fazia e olhou para o fundo da grande casa onde a festa era realizada. Lá, observou um jovem, todo roto e estropiado. Ao lado dele, outra pessoa se fazia presente, uma senhora já idosa e também muito humilde, e que mantinha a cabeça baixa, como se procurasse captar no ar algo mais do que seus sentidos lhe traziam.

--Como pode saber que é o coração o meu bem mais precioso, meu rapaz? --Pérola perguntou, surpresa.

--Por esta senhora, que me acompanha! Ela é cega, e me guiou até aqui.

Ninguém entendia o que estava acontecendo, e nem mesmo Pérola parecia saber. Ela desceu de onde estava e foi até aquele rapaz, para tentar entender melhor. Chegando até ele, pediu suas explicações.

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--Quando eu era muito novo, meu pai saiu atrás de um bruxo, para dar fim em suas maldades, e o acompanhei. Ao chegarmos até o local, encontramos o tal bruxo e a luta foi fatal, tanto para ele quanto para meu pai. Sobramos eu e esta senhora cega, que lá estava aprisionada. Ela, durante anos, me guiou até aqui, conduzida unicamente pela luz que enxergava e que dizia vir dos olhos de sua filha. Aqui chegamos, mas descobri que tal luz pode até vir de seus olhos, mas apenas um coração que tem um amor muito grande, é que pode emanar uma força dessas, tão rica e poderosa.

Pérola, estarrecida, abraçou aquela velha senhora, e bastou um único carinho recebido para saber que era realmente sua mãe. E ali teve a certeza de que poderia possuir qualquer riqueza ou poder, mas nada jamais superaria seu maior tesouro: o amor que carregava no coração.

Marcio JR