quarta-feira, 2 de novembro de 2011

RECONSTRUIR



Tempestade - by Google
“Reconstruir”. Indica ação, ato ou efeito de refazer. 

Reconstruir, em sua acepção, pode demonstrar algo belo. A vontade e a força que vem do ser humano em montar algo novamente, a resiliência tão peculiar em alguns, a determinação para seguir adiante apesar dos percalços. Tantos são os fatores que podem influenciar no modo de agir das pessoas e fazê-las retomar algo, que muitas vezes mudamos nossos destinos até mesmo sem sentir. Em certos momentos, evoluímos, crescemos material e espiritualmente, mesmo apesar das intempéries. Já em outros, não encontramos força suficiente para tal, e permanecemos numa pasmaceira constante, ou pior, afundamos num estado de letargia crescente.

Música: Sândalo de Dandi (Metrô) - by YouTube

Reconstruir, no entanto, pode ascender de alguma ação desfavorável. Para reconstruir, é necessário que algo tenha ruído, sido desmontado ou destruído. Algo existia e, de repente, acabou. Em algumas situações, isso é feito de maneira planejada ou pensada, e resultará em algo melhor. Mas, e quando tudo acontece repentinamente? Catástrofes, de maior ou menor escala, acontecem todos os dias mundo afora. Furacões, terremotos e tantas outras ações da natureza interferem profundamente no mecanismo que move a existência do homem, mas não são as únicas causas que promovem “reconstruções”. A ganância, o egoísmo, a inveja, a violência, o desrespeito pelo próximo e tantas outras características negativas inerentes do caráter humano, também se delineiam nessa cadeia de ação que leva à prática de se precisar devolver a forma a algo que esfacelou.

Pessoas saem de suas casas e não voltam. São vítimas mortais de uma sociedade que se fecha em seu egoísmo. A violência corre solta, e quase nada se faz para contê-la. A palavra, arma maior da eloquência humana, virou apenas um artifício da retórica na boca daqueles que banalizam os poderes legais. E são tantas as violências.

Como se não bastasse a ânsia latente de muitos, que não se contém em seu ímpeto e saem disseminando a desordem e o escárnio, as mídias se aproveitam e pioram tudo, implantando ainda mais o conceito de anarquia na alma humana. E o que era um crime a ser julgado, condenado e castigado naturalmente pela justiça, vira um instrumento de lucro na horda comunicativa. Resumindo, para se ganhar mais, oprime-se mais. Como explicação barata, dizem que é o “povo assumindo seu direito à informação”. Pura balela. Quando a audiência cai, esse direito popular à informação é deixado de lado, quer seja pela mídia, quer seja pelo povo, que corre para se saciar em outro entrevero, e melhor ainda se for de alguém famoso, ou de algum escândalo de grandes proporções, ou ainda de algo que se possa sair falando aos quatro ventos, onde se acrescentam palavras à esmo e sem nenhuma verdade. Tudo, então, cresce novamente, tomando dimensões gigantescas, até cair a audiência e tudo voltar lá do começo, em um “looping” eterno. Teoria do infinito, ou uma ânsia inescrupulosa de se falar e difamar o alheio?

Existe a violência do lar, silenciosa por vezes, mas nem por isso de menor impacto. Os vícios, a ira, o ciúme infundado, o descaso conjugal, a luxúria, enfim, vários são os motivos que podem destruir uma família, e que encheriam várias linhas. Não raro, fatalidades acontecem, como pais espancando ou matando filhos, ou filhos matando os pais. Mulheres ou homens que traem sexualmente. Espancamento físico. Espancamento moral. Subserviência obrigatória ou, puramente, opressão física e moral. Escravidão. São muitas palavras duras, que chocam, mas que estão entrando na banalidade. E quer saber por que isso me assusta? Justamente por não nos “assustarmos” mais com tudo isso. Tudo já é tão “normal”, que dentro em breve sequer olharemos isso como uma situação de afronta, afinal, “é tão normal”...

Enfim, quando nos damos conta, precisamos RECONSTRUIR.

Quantas pessoas passam décadas ao lado de alguém, sendo oprimidas, massacradas em seu íntimo, e sequer se dão conta disso? São lesadas diretamente em seu caráter, ficam enfraquecidas, abstraídas da servidão mental pela qual estão passando, que qualquer reação parece incapaz de ser enxergada. Estão mergulhadas na situação, beirando o afogamento, mas não visualizam isso. Até que um dia, despertam para a realidade, e com isso, dois problemas surgem de pronto. Enfrentar a situação (sair dela) e, consequentemente, reconstruir a vida.

Dei voltas para chegar até aqui. Talvez eu próprio tenha caído na tal “retórica”, mas tentei traçar paralelos para mostrar que a violência doméstica não está assim, tão diferente de qualquer catástrofe natural que se vê no nosso dia-a-dia.


Fênix - by Google
Esta crônica não termina aqui, ela está apenas começando. Novo capítulo virá, e se me permitem antecipar, o que terei a dizer pela frente, muitas pessoas já estão vivendo em suas próprias carnes, e de um jeito muito amargo. Alguns nem conseguem se reerguer, não suportam enxergar a luz depois de sair da escuridão da caverna e retornam para dentro. Isso não é bom. Outros, em contrapartida, se refazem. Enfrentam as batalhas de peito aberto, mas as cicatrizes ficam. Conheço alguém assim, e me surpreendo a cada dia com essa pessoa. Mas isso é outra história, é outra crônica.


Marcio JR