segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

A MULHER PERFEITA

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Em outra época, os pais educavam os filhos homens para serem os provedores do lar. Normalmente, se formavam broncos, machistas, e pouco ligavam se tratavam ou não uma mulher com delicadeza. Grande número desses homens nunca aprendeu a respeitar uma mulher, principalmente aquela que ele mantinha dentro de casa, a esposa, que vivia quase que num cárcere. Mas, o tempo passou, e hoje, a maioria dos filhos sequer mantém contato com o pai. Alguns nem têm idéia de quem ele seja. A modernidade também alterou e aumentou um pouco a capacidade do homem em se mostrar sensível, e os machões de outrora, já admitem muita coisa que antes seria verdadeira heresia, como chorar ou se apaixonar, por exemplo.

No entanto, mesmo que a educação dessa época passada fosse severamente direcionada para um lado chauvinista, Carlos Eduardo, o Dudú, cresceu num ambiente mais aberto. Filho de músicos, sempre teve um contato estreito com as artes e letras. Sua situação financeira não dava para gastanças exageradas, mas, depois de formado, conseguiu manter uma condição social relativamente boa. Sua aparência era a de um atleta, coisa de genética, pois jamais praticou nada além de caminhadas, e as garotas viviam suspirando por ele e por seus cabelos aloirados. Ele, mesmo com esse assédio, não passava das paqueras. Quando argumentado se não pretendia casar, sempre repetia:

--Estou esperando a mulher perfeita, minha alma gêmea, a outra metade da minha laranja.

E assim, o tempo passava. Boatos sobre sua condição sexual eram constantes, e não era incomum alguém afrontá-lo e tratá-lo de pederasta (o termo era comum no começo dos anos 80), o que o deixava fulo, mas, mesmo assim, ele se controlava e continuava em sua busca. Um dia, ela apareceria, sua mulher perfeita.

Certa vez, encontrou alguém que pensou ser sua iminente pretendente. Morena, alta, belíssima e culta. Não havia homem que não desatinasse por aquela mulher, principalmente por ela ser de família de posses, e muitas. Mas, para desespero geral, ela era apaixonada pelo Dudú, e eles noivaram. Algum tempo depois, a bela morena foi encontrada aos prantos na praça da igreja, e espalhava aos quatro ventos que o noivo a havia abandonado. Não contente, contou a todos o motivo da separação: ela não era uma tampa (a tampa da panela dele). E foi além, relatando que, no alto de seus vinte e cinco anos, ainda era pura, e o Dudú sequer se interessou pela questão. O falatório foi geral, e o Dudú precisou mudar de cidade. Foi de São Paulo para o Rio de Janeiro morar e trabalhar.

A cidade mudou, mas o assédio não. As mulheres sobravam aos borbotões, e ele as tinha a sua bel vontade. Mas, e quem disse que ele ligava? Ele queria uma em especial, a mulher perfeita. E assim, chegamos à virada do milênio, e o Dudu, aos seus cinquenta anos de idade. Sua condição financeira melhorou, mas o aspecto físico e os cabelos decaíram e caíram. As mulheres já não se interessavam tanto, mas ele não ligava. Ainda esperava aquela que o completaria.

E foi que, numa tarde de chuva, ele correu para se esconder numa confeitaria e a viu. Era ela, e ele sabia, pois um estrondo tomou conta de seu cérebro. Seu corpo tremeu todo, e o suor correu em bicas, parecendo acompanhar o retumbar do coração.

Mas, por que ela? Não tinha nenhum atrativo especial, era baixinha, cheia de sardas, cabelo desgrenhado, o comportamento não era lá dos melhores e, além do que, muito mais jovem. Mas, era ela, e ele tinha certeza disso, mesmo sendo totalmente diferente de tudo o que idealizou no transcorrer dos anos. Pensou, olhou, analisou e achou um problema. Encontrá-la ele já havia feito, mas como se aproximar?

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Durante um mês, ele a seguiu, cercou, tentou se aproximar, até que conseguiu. Descobriu seu nome: Diana. E desmoronou de vez, apaixonado. Fez de tudo, desde as flores, presentes, convites para passeio, propostas de namoro, propostas menos descentes, e nada. Até que um dia, já cansado de esperar, resolveu abrir o jogo e se declarar apaixonado e querendo casar. O que ele ouviu dela?

--Sai prá lá, tio. O que eu quero com um cinquentão? Além do quê, estou atrás do homem perfeito, minha alma gêmea, a tampa da minha panela, e definitivamente, esse homem não é você.

Marcio JR

19 comentários:

  1. Marcio...
    É por essa e por outras que jamais percurei a certa... pulei sempre de gáio em gáio e me diverti com as erradas merrmo..... E pra moçoila que procura .. Um Deussssssssskiajude ela... rsss
    E prêle que ta cinquentão e não achou... DeussssssskiLeve.... rsss

    E pra tu que escrivinhou tão bela estória...
    Deussssssskiajude e conserve....
    Tatto

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  2. É desastroso mas, o tempo passa e os mais tristes, são os que ficam parados no tempo.
    Bom estar aqui novamente!!!

    Beijos de passarinho!!!

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  3. Meu querido,
    Além de crônista agora é humorista. Ri um bocado com a história do Dudu e da tampa da panela. Esse termo ainda não tinha ouvido.
    Há quantos anos não ouvia/lia o termo "pederasta", penso que é anterior a década de 80. Ouvia isso na minha infância.
    Muito boa a história do Dudu.
    E nada de esperar a alma gêmea, almas contrárias dão mais certo.
    Meu abraço e meu carinho de sempre.

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  4. Por essas e outra que eu digo que a metade da laranja da gente pode ser uma metade de limão. Dá suco gostoso do mesmo jeito. rsrs. Espetacular esse conto, Márcio. Alías, coincidentemente, li agora há pouco no blog da Rejane (Simplesmente Rejane), uma crônica bacana sobre o que os homens sentem quando estão apixonados. Acho que você pode gostar. Abração, Màrcio. Paz e bem.

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  5. Para mim, meu caro Marcio, ler tuas belas e saborosas crônicas é também mergulhar na minha (nossa) língua, é resgatar termos, expressões e imagens de quase uma outra vida. Teu poder de descrição, tanto do fora como do interior das pessoas, é simplesmente extraordinário. A parceira ou parceiro ideal... quem nunca já sonhou disto? quimera das maiores, busca das mais puerís quando se sabe que cada ser humano é a metade de si próprio e de mais niunguém. Daí as paixões, as separações e o balé de sempre dentro desse carrossel que é a vida.

    Uma saborosa crônica e tingida desse humor fino e perspicaz do qual só tu tens a fórmula, caro amigo. Porém, concordo com a Regina Coeli: o termo "pederasta", penso, esteve em voga uma ou duas décadas antes dos anos 80, ou seja, era da "minha época"!!

    Meus aplausos de sempre, querido amigo, e obrigado por nos proporcionar um tão agradável texto.

    Forte abraço,
    André

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  6. Resumo assim: pino quadrado, buraco redondo. Não adianta forçar que não encaixa.
    Perfeição não existe, mas é preciso ao menos que seja do mesmo molde...rsss
    Beijitos

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  7. Uma crónica bem humorada. Relato de uma época da nossa vida em que desejamos acima de tudo o belo e o mais perfeito.
    Aqui na minha aldeia dizem:

    «não há bela sem defeito»

    Como os tempos mudaram e hoje eles e elas aproveitam o que encontram e amam perdidamente.

    Depois...cansam-se e cada um procura a sua metade e por aí se ficam em metades incompletas mas livres........

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  8. Ah, os desencontros do amor...
    Estou um pouco sensível para falar deste assunto, por isso vou, só dessa vez, me abster de maiores comentários... rs.
    BJs.

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  9. Ironia do destino? Sinceramente falando, penso que almas gêmeas só existem em romances.Mais um texto maravilhoso, leve, divertido, delicioso de se ler. Aplausos,Marcio.Sempre no coração.bjs,Ione

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  10. Ei Márcio,
    A verdade é que passamos a vida a idealizar pessoas e situações e como dirai a frase "idealizar é sofrer", porqu o objeto idealizado nunca corresponderá ao que imaginávamos...

    Beijinhos.

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  11. Hua, kkkk, ha, ha, rapaz, realmente, escolher / manter a idéia de perfeição só gera solidão, mas muita mesmo...

    Fique com Deus, menino Marcio JR.
    Um abraço.

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  12. E isso acontece com certa frequência, Marcio!
    Muitos julgam que o ideal de alguém virá estampado em formas e curvas. Infeliz de quem não percebe a real beleza de cada um, não é?
    A vida passa e alguns ficam a esperar quem já esteve bem perto, e agora tomou outro caminho.
    Bjo, querido.

    Passo tb para agradecer o carinho lá no blog.
    Tem post novo por lá, viu?
    Outro bjo, amigo Marcio.

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  13. Eita maninho, que texto!
    Ás vezes procurar d+ da nisso hehhe.
    Bom, falando sério.
    O amor é algo sem explicação, e quando ele chega, chega e ponto.

    Beijo queido.
    Fernanda.

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  14. Oi Márcio,
    Nunca vi tantos desencontros como hoje, é uma busca não sei do quê, uma procura de algo idealizado e que muito provavelmente nem existe. Assim, vão se abortando encontros e amores possíveis.

    Abraço

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  15. Oi Marcio! Adoro seus textos! Quem espera pela perfeição, nunca encontrará ninguém nunca... pois a pessoa perfeita não existe... Beijo!

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  16. Oi AMIGO QUERIDO...

    Eu digo que "seria cômico se não fosse trágico".

    Situações que presenciamos acontecer bem debaixo do nosso nariz...

    bjos de saudades!


    Zil

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  17. Eita! O que devo analisar disto aqui!
    Devemos então esperar por o príncipe ou princesa encantado (a) ou devemos nos conformar com qualquer um enquanto temos cabelos?
    Pronto, fiquei confusa!
    Um texto para muito refletir!
    Abraços...

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  18. Ë, não adianta procurar, acabamos sendo achados mesmo NÉ. adorei o texto.
    Beijossssssssss

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  19. É por essas e por outras que não se deve esperar a pessoa certa, porque esta se torna muito difícil e chata, o ideal é que encontremos a "errada", pois esta traz muito mais alegrias para nossas vidas. A pessoa errada nos "bagunça", nos faz rir nos momentos mais impróprios e também nos faz enxergar a real beleza da vida, até porque a mesmice cansa.
    O Dudu tanto buscou perfeição que encontrou infelicidade, pois a perfeição não existe.
    Parabéns, meu caro! Amei o texto.Grande beijo no coração.

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