quinta-feira, 13 de março de 2014

É AO CONTRÁRIO






Nem sempre um “É” ao contrário é somente uma letra do avesso. Por vezes, um “É” ao contrário pode ser um “NÃO”.

A antecipação inconteste veio juntamente com a subversiva voz rouca e demente do peito.

―“É”! ―disse o peito, todo esfarrapado das quedas e derrotas. ―Eu não sei o peso do chão, mas ele sabe o meu, por certo. E sabe também da cor do meu sangue. Sabe da dureza de meus gemidos sempre que esfolo junto com a boca. “É”! O chão é duro, e estou cansado dele.

O pior não é o gosto salgado do suor. O pior é sentir o suor amargar com o salgado da lágrima. Azeda-se tudo. E não, não farei salada com os pepinos da vida, pois cansei de mastigar coisas insossas. Quero é beber vinho do bom.

―“É”! ―tornou o peito. ―A verdade é que apenas querer não basta. O avesso da letra é o inverso da palavra.

Acho que estou dormindo, e sonhando. Mas nem em meus sonhos me deixam quieto? Que quer então? A decisão não basta?

―“É”! ―aquele chato do peito falou novamente. ―Não, não basta. Decisão sem ação, é como reação cheia de omissão. É preciso determinação.

Cara irritante. E justo nessa hora? No instante em que sonho com meu bem querer, e em cenas censuráveis para olhos que não acatam lá muito bem a obscenidade de meus devaneios.

―“É”! ―lá vem o peito de novo, e vou dar uma porrada nele logo, logo. ­―Torça para ter uma única letra do avesso, pois se outras vierem, sabe-se lá quanto mais de mal agouro tua vida vai abraçar.

Desaparece do meu sonho. Me deixa quieto. Amanhã eu expurgo a dor, e tomo chá de compromisso. Mas agora, da pra dormir junto com teu dono? Eu, no caso!

―“É”! ―falou, e aquietou-se.

Ei, peito! Volta aqui, pra gente conversar mais um pouco. Perdi o sono.

É! Esse chato tá certo. Mas, com tanta coisa nesse mundo pra ilustrar meu sono, por que cargas d’água eu tenho que sonhar justamente com um “É” ao contrário?


Marcio Rutes



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2 comentários:

  1. É!
    Tantas vezes já te disse desses devaneios sem presunção, sem areias movediças nas mãos. Porque quando anoitece, meus sussurros são morcegos em busca de uma fresta de luz.

    É!
    Tampouco é esse verso desaguando um mediastino sem pudor, sem beiradas de nãos e outros idiomas.
    São estradas sorvendo todos os restos e pouco a pouco todas as lágrimas que cristalizam nos olhos, montanhas de talvez.

    É!
    deixa desse monólogo meio disfarçado de desventura e vem pra cá que te costuro a sua boca na minha.
    Trilhando caminhos escuros, minhas mãos são de qualquer caligrafia, o meu espato todo carregado na minha nudez sombria e ébria de solidão, sempre à meia noite.

    É!
    todo vento é açoite sem braços pra se envolver.
    E o sal do suor vertido é mais que bebida destilada visceralmente de um sangue que não se envenena, nem remedia. Que não se dissolve... só nos consome!

    Mas, não é que essa conversa toda não vai nos levar a nada e para ninguém?!

    Então, deixa de léro que te quero sem distorções santificadas e o que vale é a mundana forma de te destilar na saliva, as minhas contradições inteiras das tuas monossílabas.

    Ameiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!!!
    Ameiiiiii o efeitooo tudo tudo tudo!
    Showww meu amorrrrrrrrrrrr.
    Sam.

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  2. É bom de letra! Contrário tem não. Certeiro, criativo. Valeu!

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