Butiá - palmeira e fruto - by Google |
Aquela caminhonete era
enorme. Grande mesmo, totalmente fora dos padrões daquela cidadezinha de porte
médio lá pelos lados do interior. Parada no estacionamento do banco, ocupava o
espaço de dois carros grandes.
Seu Oscar, o morador
mais ilustre de uma cidade próxima, desceu fazendo pose. As botas, de couro de
crocodilo, brilhavam em parceria com a grande fivela do cinto que segurava sua
lustrosa calça jeans, e que diga-se, era mantida sempre muito bem passada a
ferro e, claro, com um aparente vinco nas pernas. A camisa era quem sofria.
Branca e em estilo social, quase se arrebentava na altura da saliente barriga.
Na cabeça, um chapéu de boiadeiro, daqueles de rodeio, e decorado com alguns
butiás, fruto de uma palmeira típica da região. Seu Oscar ostentava sempre
aqueles frutinhos, pois dizia a quem quisesse ouvir que sua fortuna era devida
a eles.
Logo depois de Seu
Oscar, apareceu dona Aleluia, sua esposa. Ela fazia o estilo esguio, alta, e
com os cabelos desgrenhados. O vestido longo, e florido de lilás e azul,
marcava bem as ancas largas, deixando para as mãos um par de luvas importadas,
e que ela gostava sempre de gabar a procedência: Paraguai. No rosto, a
maquiagem não era pouca, e em momento algum pretendeu a discrição.
E para completar a
família, os 3 filhos: Cajuino, Equinócio e Perestróica.
Já diante do gerente
especial que cuidava de suas contas, seu Oscar ordenou:
―Fio, invista naquilo
que melhor me render. To quereno fazer uma viagem pra Poconé, e adespois
esticar pra minha fazenda. Não quero percupação com meu dinhero.
―Poconé? ―perguntou o
gerente, tentando ser simpático ao extremo com aquele que era um cliente tão
rico.
―Oxe! Tá achano pouco?
Intão jogue mais uns 100 mião junto. Si o sinhor acha pouco, é purque sabe do
que tá falano. O sinhor é a otoridade aqui.
O gerente sorriu, e
meio sem jeito, explicou que fazia referência a cidade para onde seu Oscar
viajaria. Mas, obviamente, aproveitou e jogou mais aquela soma para o
investimento. E como queria agradar ainda mais ao cliente, resolveu servir um
café e esticar a conversa.
―Mas, me conte, seu
Oscar. Como o senhor fez para amealhar toda essa fortuna? Existe alguma fórmula
que o senhor possa ensinar?
―Seu moço, num ameiaiei
nada não! Eu trabaiei é muito. Eu e Aleluia!
―Aleluia, seu Oscar.
Aleluia!
―Que Aleluia? Purquê falou
ansim?
―Ué? Eu falei aleluia
no sentido de “graças a Deus”!
―É! Foi cum fé e trabaio.
Eu e minha Aleluia!
―Aleluia!
―Di novo? Purquê o
sinhor só repete o nome da minha mulher? Pur acaso acha que ela trabaio mais du
que eu? Aliás, Cajuino só largava o enxadão quando chegava Equinócio. Era duro.
―O que? Não entendi
nada! O senhor plantava cajú nos equinócios de outono e primavera? Mas cajú nem
dá por essas bandas.
―Tá dando uma de
abestado cum eu, é? Que cajú? Cajuino é fio meu, o mais véio. Adespois veio
Equinócio, junto com a Perestróica.
―Ah! Tá! Entendi. Me
desculpe. Mas então, o senhor já estava casado quando veio a abertura
soviética?
―Quem é essa muié que
o sinhor falou? Essa tar Soviética? E purque ela veio aberta? Tinha ispinhéla
caída?
―Hã? Como assim? Não,
não. É que foi na abertura soviética que veio a perestróika.
―Vo ti dá um amansa
corno nos beiço já já se o sinhor não parar de ofender minha famia. Perestróica
é minha fia, e veio de Aleluia. A partera num era essa tar de Soviética, e nem
muito menos tinha ispinhéla caída. Me respeite, tarzinho.
Eles se olharam
fixamente por alguns instantes, e seu Oscar reparou uma gota de suor escorrendo
pela face do gerente. O rapaz parecia perdido, e quem sabe nem tivesse sido a
intenção dele ofender assim. Então, seu Oscar continuou no relato.
―Bão. O começo foi
dificir. Eu era bóia fria, e conheci a muié da minha vida. Aleluia.
―Aleluia! ... ops...
perdão, seu Oscar. É a força do hábito.
―...tá. ...sei. Mas
como eu falava, conheci Aleluia. Ela morava numa área de terra muito ruim,
coberta com esse tar de butiá, uma parmera que eu nunca tinha visto lá donde eu
vim. No começo, quando casamo, eu cuidava da terra e era servente de pedrero,
enquanto Aleluia colhia e vendia butiá. Logo depois, veio uma estia grande, e
por um acaso de Deus, nossa porpiedade foi a única que manteve um pouco de
água, mas como nóis num plantava muita coisa além daquelas parmera, e nem
criava gado, passemo a usar a água pra moiar só elas. Ficou uma belezura, e a
gente viu que só nóis fiquemo com essas parmera na região. Aleluia.
Seu Oscar calou, e
como percebeu que o gerente não iria falar nada, retomou a palavra com certa
irritação.
―Tá mangando di eu, é?
Falei aleluia, em gardecimento, i o sinhor num vai arresponder não, seu
abestado?
―Aleluia, aleluia! ―o
gerente respondeu, sem entender nada.
―Mior ansim! Mas,
enfim, o tempo passou, e nossos butiá começaro a fazer o maior sucesso. Era os
butiá de Aleluia, como o pessoar falava. Inventemo suco, doce, artezanato cas
foia e inté licor. Era o Licor de Butiá Aleluia.
―Mas que maravilha!
Parece muito bom, seu Oscar.
―É muito mior do que o
sinhor pode pensar! Num tem ser vivente lá no vale das Parmera, donde moramos,
que já num tenha dado umas beiçada no butiá da minha mulher. Só o padre é que é
um chato. Nunca bebeu o licor que sai do butiá dela.
―Como assim? Não
entendi!
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―É que o padre é meio
chato. Ele acha o licor do butiá da minha mulher um poco grosso. Diz ele que
tem cheiro forte. Mas o padre é danado. Não posso virar as costas que lá tá o
padre cá vara na mão, pronto pra comer o butiá da minha mulher.
―Como é? Não to
entendendo!
―Ele mete a vara no cacho. Pior é que ele judia do butiá dela com isso. Mas o fato é que si temos
o que temos hoje, devemos ao butiá da Aleluia. E que butiá gostoso. O senhor
quer provar?
―Provar o que? Como
assim?
Seu Oscar,
repentinamente, levantou-se e procurou por sua esposa. Quando a enxergou,
soltou um assobio, que chamou a atenção de todos, e começou a falar alto,
bradando pela esposa.
―Aleluia! Aleluia!
Sem entender nada, os
outros clientes, em coro, responderam:
―Aleluia! Aleluia!
Seu Oscar olhou todo
sorridente para o gerente do banco, e falou baixinho:
―Mas, óie, seu
tarzinho. Viu como todos bradaram o nome de minha mulher? Todos eles já devem
ter comido o butiá de Aleluia! Que orguio qui eu tenho!
Ainda sorridente,
virou novamente para onde estava a esposa, e continuou falando alto.
―Aleluia, mande
Cajuíno ir até Equinócio, e traga a cesta. Hoje, todos os que estão aqui vão
comer teu butiá, mulher. E o melhor, de graça. Eu to feliz, e todo aquele que
quiser comer o butiá de Aleluia, pode fazer fila aqui. E guarde um butiá bem
graúdo, que é pro seu tarzinho aqui poder se lambuzar no teu butiá, mulher.
―Seu Oscar, por favor!
O senhor está passando dos limites!
―Ara, tarzinho! Se o
sinhor não é chegado num butiá, minha fia tem umas vaquinha de leite. Já provou
o leite de Perestróica?
―Mas isso já é o
cúmulo! Que pouca vergonha! ―o gerente gritou, indignado. ―Eu não quero comer o
butiá da sua mulher. Não quero comer o butiá de ninguém aqui. Se eu quiser
comer butiá, como o meu mesmo! E também não quero saber do leite da perestróica
da sua filha.
O gerente gritava e se
agitava, até que percebeu que todos olhavam para ele de uma forma esquisita.
Foi quando o filho de seu Oscar apareceu diante dele com uma enorme cesta,
cheinha dos frutos de que seu Oscar tanto falava.
―Ah! Então são esses
os butiás de sua mulher?
―Mas é craro, soh! De
qual butiá então o sinhor acho qui eu tava me arreferindo?
―Nenhum, seu Oscar.
Nenhum. E ainda bem que o senhor não planta cajú, pois eu até imagino como
seria complicado comer a castanha do Cajuíno. Que confusão. Acho que
me perdi nessa bagunça toda de nomes. Devo confessar que eu cheguei até a
sentir que algo meu ficou apontando para um equinócio de primavera, mas foi por
pouco tempo.
―O que o sinhor tá
arresmungando aí, seu tarzinho? Num to intendendo nadica!
Alho - by Google |
―Bom, por sorte o seu
nome não segue o padrão de complicação do restante de sua família.
O gerente,
completamente corado, sentou-se. Mais calmo depois de alguns minutos, retirou alguns
papéis da gaveta e começou a analisar, até que viu algo estranho.
―Seu Oscar! Me parece
que houve um erro de digitação aqui nos documentos. Seu nome está incompleto.
Está apenas como “Oscar A.”. Qual é seu nome completo, afinal, seu Oscar?
―Ah, seu moço. Meu
nome é uma belezura em homenagem ao melhor fruto da terra. É Oscar Alho. E
falando nisso, dizem na minha terra que depois de dar umas dentadas no butiá da
minha mulher, a melhor coisa que tem é sapecar um alho no forno. Dizem que o
cheiro é uma delícia.
―Eu mereço! Eu mereço!
―o gerente suplicou, desanimado.
Marcio Rutes
não copie sem autorização, mesmo dando os devidos créditos.
SEJA EDUCADO (A). SOLICITE AUTORIZAÇÃO.
Ah maninho você é mesmo incrível.
ResponderExcluirUm texto digno de grande escritor.
Beijo.
kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk, você é phodaaaaa, né Marcitchoooo???!!!!
ResponderExcluirAi, me deixa tomar um fôlego, que depois dessa 'comédia trágica', até euuuu estou me sentindo familiarrr! rsrsrs
PESSSSTEEEEEEEEE!!!!
Pra começar, esse tal de Equinócio e Perestróica já anunciavam que vinhaa coisa pela frente ( ou por trás, vai saber)!!!
Não me rachar de rir, é duro, muito duro. Eu que já sou rachada, mas enfim, isso é outro assunto rsrs Claro, nada a ver com o Equinócio. Aliás, eu tinha uma aranha, não assim tanto pra tarântula, mas bem caracteristica que se chamava perestróica também, sabia? ééée'! É mesmo uma zona! Por isso que tenho um medo danadoooo de aranhas. Aliás, eu preciso visitar esse gerente e avisar que o leite da perestróica é venenoso. Não aconselho arrisca-se rsrs ;)
Essaaaa porra de butiá tava é demorandoo pra aparecer, viu?!!! Quer dizer, butiá dá 'suco' desde quando????
Olha, sinceramente, eu não deixaria qualquer um cutucar com sua vara o meu butiá, que tanto criei com dedicação. Ahhh, sugere um doce pro gerente: butiá com figo murcho!!! Será que fica bão?!!!!
Éguaaaa!!!!
Aleluia, acho que se salva nisso tudo, deve ser mesmo uma santa mulher. Mas que coisa gozada: ela comentou comigo que não gosta de butiã em calda que a Perstróica faz, mas na hora de ajoelhar pra rezar, ela estava se lambuzando com o doce. Deveria estar tão bom que mal queria falar, só ficou mesmo no Ahhh, Ahhh, Ahhhh..... Aleluiaa!!! - Gritou, diante dos caral.... ops Senhor Oscar.
Meio doida essa familia, não acha.
Mas que coisa, Cajuzinho também dá, é? Quer dizer, Cajuzinho é um nome carinhoso. Sabe, o conheço há muito tempo e a castanha que ele tem é da melhor qualidade, mesmo assim como todas as outras que quando se aperta muito, solta muito óleo. Enfim, faz parte! rsrs
Bom, deixo o meu inté por aqui, mas ainda pretendo conhecer a plantação do Seu Oscar, imagino que além das palmeiras, ele deve estar investindo agora em pézinhos menores, de... alho, né?! ;)
Showwwwwwwwww meu amorrrrrrrrrr, putss que zonaaaa da porraaaaaaa e eu me racho de rir com essa putaria toda, do bem, claro rsrs
Pesteeeeeee!!!
Criatividade e talento assim é que tá precisando cada vez mais esse mundão bão!
te amoooooooooooooo
Ameiiiiii
Samara Bassi.