quinta-feira, 21 de junho de 2012

TEMPOS MODERNOS


Image by Google

O fim de tarde caminhava apressado naquela cidade grande. Em um barzinho qualquer, duas amigas conversam despreocupadamente sobre suas vidas sexuais.

--Pois é, minha amiga. Comprei aquelas calcinhas que ele adora. --falava a mais novinha, sem se preocupar com as pessoas a sua volta. --Entrei naquela loja virtual, e detonei meu cartão de crédito.

--Como está a relação? Ele é quente mesmo, ou é só fogo de palha? --questionou a outra, procurando assunto para futricar.

--Ah! Já faz mais de seis meses que estamos juntos, e ele me leva as alturas. Me excita, me joga na parede, me vira do avesso, me faz de lagartixa...

--Lagartixa? Que trem é esse?

--Sei lá. Alguém escreveu na internet e eu gostei. Ou escutei na TV, nem sei.

--Você se deixa levar demais por essas coisas de TV e internet. Por vezes, esquece de viver a realidade da vida. --a mais velha argumentou, enquanto levava seu copo à boca.

--Que nada. Os tempos são outros. A vida está mais acelerada, e não dá tempo de viver como antigamente. Temos mil coisas pra fazer, mil lugares pra visitar, mil pessoas pra falar. Tem Facebook, MSN, blogs, Twiter, enfim, um milhão de coisas pra curtir.

música: TEMPOS MODERNOS (Lulu Santos) - by YouTube

--Tá! Esquece isso e me conta. E teu namorado, que nem conheci ainda? Você anda tão sumida, dedicando teu tempo só pra ele! Não pode esquecer as amigas e o mundo assim, desse jeito!

--Ele é maluquinho. Adora sair do trivial. Ele me completa, me preenche, está sempre comigo, e discute a relação sempre que podemos.

--O quê? --a mais velha perguntou, num tom de perplexidade bem visível. --Um homem que discute a relação? Isso não existe.

--E tem mais. Ele me acorda de madrugada, pra fazer amor.

--Não creio! Isso é um achado, uma jóia rara!

--Olha, ele é o homem da minha vida. Nunca tive um homem assim nas minhas mãos. Ele me faz confessar meus desejos mais secretos.

--Como assim? Te conheço bem, e sei desses teus "desejos secretos". Você é uma verdadeira tarada. Não vai me dizer que...?

Um breve silêncio tomou aquela mesa de bar. As duas, rindo, se olharam e a mais nova das duas enrubesceu.

--Pois é! Nós fizemos troca de casais.

--Nããããããão. Me conta tudo, nos mínimos detalhes.

--Ah! Tenho vergonha!

--Mas nem pense em sentir vergonha de me contar algo. --a mais velha ficou indignada e reclamou. --Pode contar, vai. To curiosa demais.

--Estávamos namorando e, do nada, ele me perguntou o que eu achava de swing. E eu soltei meus sonhos. Falei que sim, que topava.

--Tá. Conta, vai.

--Bom, não demorou muito, e ele já ficou todo excitado. Saímos do Skype, fomos pro “chat” do UOL e...

--Pára. Espera. “Chat”? Que história é essa de “chat”?

--Você não sabe o que é um “chat”? Que bobinha!

--É claro que sei o que é um “chat”. É um bate-papo online. Só que pensei que vocês tinham feito troca de casais mesmo. De verdade. Olho no olho, mão na mão, e outras coisas em outras coisas. Sexo de verdade.

--O quê? --a pergunta veio em forma de indignação, o que chamou a atenção das outras pessoas que estavam perto. --O que você pensa que eu sou? Alguma depravada, que sai por aí transando com qualquer um?

--Não é isso! É que...

image by YouTube
--Essa é a imagem que você tem de mim? Que saio por aí igual uma maluca? O mundo aqui fora é muito perigoso. Tô muito triste com você, amiga.

--Tá. Tá bom. Me desculpe. Mas, e qual é o nome desse teu namorado? Agora que me dei conta que nem isso eu sei.

--O nome dele é wilson38_solitário@ig.com.br. Nos conhecemos no Facebook, e foi amor a primeira “cutucada”. Temos a maior afinidade virtual.

--Não entendi. Esse é o nome ou o "nick" dele? Quer dizer que vocês nem se conhecem ainda? Nem o nome dele você sabe? E o papo de vocês se amarem, de namorarem por horas, e de você comprar até calcinhas que ele adora?

--Ai, amiga. Que ultrapassada que você é! E você acha que eu tenho tempo pra ter um namorado de verdade? Agora, dá licença, pois preciso ir pra casa. Tem um restaurante que inaugurou ontem, no Facebook, e vou com o Wilson, num jantar virtual. Tem até pista de dança por lá. Te encontro depois, no “chat” do UOL. Quem sabe eu te arranje um "love" de verdade por lá. Você tá precisando, amiga.


MarcioJR

12 comentários:

  1. rsssssssss....Credo!!As coisas tão mudadas assim,rs Só rindo da tua criatividade. Será esses tempos chegarão? Tenho esperança que volte um pouco mais do mão na mão de verdade e etc,rs Linda crônica, divertida!! abração,chica

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  2. Muito bom, Márcio.Excelente crônica para refletirmos sobre essa loucura que é o mundo virtual e que ao meu ver veio para mudar tudo mesmo, inclusive a forma de nos relacionarmos... mas eu ainda sou das mais antigas e ainda penso que o virtual só é bom quando complementa o real e não quando substitui, mas vai saber as gerações futuras...

    Beijinhos.

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  4. Muito bem amigo,com um belo toque de humor,uma critica a esta mudança de comportamento e banalização das relações.Perfeita cronica do cotidiano de nossas cidades,para uma cena tão comum em qualquer estabelecimento ou playground.
    Meu abraço de bom fim de semana.

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  5. Marcio, muito bem escrito e olha...não duvido MESMO, que isso aconteça, se a gente procurar, acha quem faça isso...mas por outro lado, a sua crônica deixa tambem um alerta muito importante...as meninas de hoje, não generalizando, mas a grande maioria, vive totalmente dependente da internet, bate papos- redes sociais etcccc, e isso é um agravante, pois essa história que acaba de relatar em sua crônica, poderia ser real e acabar em uma tragédia.
    Ficou a dica NÉ.
    Parabéns meu lindo, como sempre arrasando no que escreve.
    BeijosSSSSSSS

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  6. Como sempre, Marcio meu amigo, tu enveredas por uma conversa trivial para dela retirar elementos que nos fazem pensar, além de teceres uma crítica, por vêzes, sutílima a um assunto ou fato do cotidiano. E esta é a marca do verdadeiro cronista. Por sinal, as imagens que escolhes para ilustrar teus textos são também das mais felizes que conheço, honestamente.

    Esta tua inteligente crônica me remete a uns 13, 14 anos atrás, meu amigo, aos meus anos "salinhas de bate-papo". Precisava praticar a língua (antes que a esquecesse de vez), saber do Brasil, e, por isso, costumava frequentar esses "barzinhos virtuais". Tua crônica reproduz com fidelidade os elementos daquele mundinho fantasioso. E, mais interessante ainda, ela estabelece parâmetros de confrontação de realidade para aqueles que, como eu, ficaram a se perguntar o que se passaria em certas cabeças quando estas deixavam o universo virtual.

    Soube que muitas das experiências vividas nessas salinhas virtuais foram causa de depressões emocionais medonhas em certas pessoas. De frustações. Outras, ao contrário, geraram casamentos. Separações também. Na vida real, nos encontros, descobria-se que as "Vera Fischer" virtuais nunca se pareciam exatamente com a conhecida atriz. Muito pelo contrário até, segundo soube. Nos encontros reais, muitas mulheres descobriam que os Richard.Gere/51 por quem se apaixonavam nas salinhas, estavam mais para Maguila/28. E se frustraram, coitadas.

    Quantas histórias… E, hoje, passados 13 ou 14 anos daquela época, vejo que ainda certos modismos continuam de pé entre as gerações. Como sempre, Marcio, tuas crônicas aliam esse saboroso jeito de narrar, esses diálogos totalmente naturais, espontâneos, sem afetação, a um crítica de costumes quase subliminar, porém, sempre lúcida e pertinente. Obrigado pela saborosa crônica, meu amigo.

    Me faz de lagartixa… taí, uma expressão que faz minhas meninges ruminarem. História de subir pelas paredes?… de andar pelo teto?… de viver comendo moscas?… meu querido Marcio, obrigado também pelo objeto de reflexão que me deste, minha parca massa cinzenta estará certamente muito ocupada pelos dias que virão.

    Não sem deixar aqui o meu agradecimento à tua fidelidade e à generosidade que sempre tens para com as minhas letrinhas de macarrão, fica também o meu forte abraço. Bom fim de semana, meu irmão.

    André

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  7. Oi, Márcio! Obrigada pelos comentários que sempre deixas em meu post,eles fazes a diferença podes ter certeza.Tenho aprendido em todas as estações ver o lado terno de cada uma para não me apegar só ao lado negativo.

    Como relatas em tua crônica, de maneira inteligente,hoje é tudo muito banalizado, as relações, os valores. Tudo é tão rápido, o que começa já não existe mais amanhã.A luta é pela quantidade e não pela qualidade.

    Tenha um lindo fim-de-semana. Abraço!

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  8. É, meu amigo, não posso dizer qeu esse seja o futuro que nos aguarda pois ele já é presente para muitos e muitas. Pessoas cada vez mais arredias ao contato humano real, se satisfazendo (mesmo que ilusoriamente) com a vida virtual onde se sentem mais soltas, mais seguras, mais humanas pois ali colocam suas idiossincrasias da forma mais aberta possível como se num divã estivessem. Isso, creio, por causa da interferência incômoda que o olho no olho provoca e por causa da atenção que elas recebem e dão (mesmo não sendo verdadeiras). O mundo tecnológico permite esse faz de conta que ultrapassa a sensação de realidade.

    PS: e a amiga que perguntou "que trem é esse" é mineira. hahahaha!

    Grande crônica. Grande abraço, meu irmão. Paz e bem.

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  9. Dizem os aficcionados por amores virtuais que o melhor da festa é esperar por ela e viver a ilusão que permeia tudo o que um dia, talvez, possa vir a ser.

    Ouso discordar...

    O melhor da festa é vivenciá-la hoje, agora, nesse instante, sem deixar para amanhã.

    Deve ser por isso que eu prefira mil vezes a certeza, à dúvida, muito embora, entenda perfeitamente o que vc quis dizer.

    Smacks!

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  10. Marcio,vc chegou antes da Chica lá no meu blog e eu quase não chego a tempo no seu!...rss...andei de molho esse fim de semana,com uma virose,mas já melhorei.Adorei o seu texto,bem atual e isso já está acontecendo!As pessoas preferem um mundo virtual ao mundo real,cada vez diminuem as relações humanas,com certeza!Genial a sua cronica!bjs e boa semana!

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  11. Márcio meu amigo,

    Já tinha vindo aqui antes, assim que postou esta admirável crônica, fiz um comentário que por birra do servidor, não consegui registrá-lo naquele momento. Fiquei de voltar depois e lá se foram muitos dias. Claro que eu não poderia deixar de registrar aqui sobre a excelência com a qual você conduziu um tema tão atual, polêmico às vezes, mas tão real em tempos que a virtualidade passou a ser um pouco dos dias de cada um de nós, seja pela necessidade de interatividade, seja pela informação, ou muitas vezes até para um convívio sadio com pessoas do bem.

    Sobre a temática aqui abordada, das carências humanas, da transferência delas do âmbito mais pessoal ao impessoal, da distorção da realidade por inúmeros fatores que levam o homem a procurar novas saídas para as suas inquietudes, da incredulidade de outros, você traçou neste diálogo entre as amigas, um perfil do que representa hoje a banalização dos sentimentos, em prol da maior valorização da superficialidade dos relacionamentos. Causas são inúmeras, consequências previsíveis, enfim, assim caminha a humanidade.

    Texto primoroso, meu querido Márcio.
    Um grande abraço,
    Celêdian

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  12. Quem não usa internet acho tudo isso uma loucura,mas isso acontece mesmo de um modo bem interessante é tudo muito "real".Excelente e divertido texto. Abraços das campinas. Kristall

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