quinta-feira, 31 de maio de 2012

A IMPORTÂNCIA DO AGORA E DO DEPOIS


dente de leão - by Google

A semente de dente de leão pousou lenta nas mãos da menina. Para ela, aquilo era a liberdade, poder voar como uma semente. Nascer da terra, transformar-se numa singela flor, virar semente e explodir para o mundo. Isso era importante.

Sentada no alto da montanha, ela observava o vale. O que havia naquele lugar que a prendia tanto? Casas simples, pessoas andando lentamente, alguns animais aqui e outros ali, o clima que não era quente e nem frio. Enfim, puro marasmo. Assim, ela levava a vida, contando cada minuto que passava e sonhando com o minuto seguinte. Viver seria somente isso? Ver a vida passar através de um caleidoscópio em preto e branco e sem a mínima perspectiva de colorir?

Ela olhou para trás e viu a estrada. Se seguisse por ela, iria de encontro à cidade grande. Lá sim a coisa era diferente. Agitação, pessoas que não paravam um minuto sequer. Grandes lojas, aparelhos eletrônicos em cada canto mostrando a modernidade, e a modernidade mostrando mais aparelhos eletrônicos que sequer seriam aproveitados, pois o imediatismo não deixava as pessoas se adaptarem a algo.

Na cidade grande, as pessoas eram “elétricas”. Elas se tatuavam, compravam cachorro-quente quando queriam, iam ao cinema, tinham TV à cabo, apareciam em outdoors, sonhavam sonhos diferentes de consumo a cada noite, saíam de madrugada... tinham a madrugada iluminada, com luzes fortes nos postes, para andar o quanto quisessem. Melhor. Não precisavam andar, pois tinham motos, carros, patinetes e táxis. Lá, na cidade grande, não existiam vacas ou cabritos pelas ruas.

Olhou novamente para o vale. De lá, veio o cheiro do doce de leite sendo preparado na única fabriqueta que empregava o povo do vilarejo. Possivelmente deveria ser algo em torno das quatro horas da tarde. Então, sua mãe estaria, neste exato momento, servindo o café da tarde. Pão de forma com geléia, café fresquinho, torresmo, bolo de fubá ou bolinhos de chuva. Chuva. Ela olhou para o alto e viu gotas de chuva encontrando seu rosto. Na cidade também chovia, e lá existiam lanchonetes e guarda-chuvas coloridos.

Na cidade grande existia tanta coisa diferente. Mas tudo tão artificial.

Uma lufada de vento bateu em seus pensamentos, e quando ela se deu conta, a semente de dente de leão escapou de sua mão. Ela levantou e correu atrás da semente, mas já era tarde. Ela voou alto e foi, justamente, na direção do vale. Não havia liberdade, afinal. Não para a semente, que a única coisa que fazia era voar ao sabor do vento. Ou, quem sabe, a semente tivesse algum acordo com a natureza, e ficasse sempre por ali, num lugar onde ela pudesse se plantar ao chão e brotar livremente. Então, ela era livre? Ficava ali por que queria isso? Na cidade, existe asfalto, e ela não brota no asfalto.

bolo de fubá - by Google
Outro dia terminou, e a menina não decidiu o grau de importância que aplicaria para seus minutos futuros. O que ela sabia, no entanto, é que naquele momento, sua semente estava plantada naquele vale, e isto era importante para ela. Correu atrás da semente, olhando-a ao longe, e sentiu-se livre, finalmente. Não entendia muito bem essa sensação momentânea, mas sequer deu atenção ao fato. Pensava, apenas, no pão com torresmo que encontraria na mesa do café. Não existia, por certo, pão com torresmo na cidade, isso ela sabia. Não aquele pão que sua mãe fazia.

Amanhã ela voltaria ao alto daquela montanha e pensaria na importância das coisas que poderia fazer nos outros “amanhãs”. Mas amanhã é amanhã, e esses minutos ainda estão no futuro. O importante é o “agora”, o presente, a vida real e imediata. O futuro deve ser programado com cautela e paciência, mas sem negligenciar o presente, pois se fizer tal coisa, possivelmente nem futuro a menina terá.


Marcio JR

sábado, 26 de maio de 2012

HÁ ALGO DE PODRE NO REINO DA DINAMARCA


image by Google

A pressa, muitas vezes, é inimiga de todos os atos, e quando aliada aos maus costumes, é ainda pior. Naquele prédio, chamado Reino da Dinamarca, parecia que todos tinham o péssimo hábito de apertar os dois botões de espera do elevador, independente para onde fossem. Quando a porta do elevador abria, pouco importava seu trajeto, e todos se enfiavam para dentro. O resultado era mais demora, e muita reclamação quando alguém entrava e constatava o trajeto contrário daquele que era pretendido. Porém, todos os moradores ostentavam certo status, nem sempre verdadeiro, mas ostentavam. E assim, fingiam que nada viam e viviam, alimentando-se meramente de aparências.

Certa feita, o elevador parara no 15º andar e, como sempre, sacolejou um pouco. Ninguém deu atenção, e mais alguém entrou. Estavam, àquela altura, em 5 no mesmo ambiente, e todos faziam aquele semblante de quem olha uma paisagem, ou seja, miravam a tudo e fingiam não enxergar nada, apenas deixando o olhar se perder pelo horizonte. Na descida, outro sacolejo, e dona Emma, senhora de seus bem vividos 85 anos, suspirou.

--Só falta enguiçar! --ela comentou, como se antevisse o feito.

Cinco segundos depois, um sacolejo maior e, bruscamente, o elevador parou. Dona Camélia, vizinha de dona Emma, blasfemou imediatamente.

--Pago esse condomínio para compartilhar espaços com essas bocas de sapo. --fazendo clara referência à dona Emma em seu presságio.

--Gente, não vamos brigar! Já, já tudo volta ao normal. --Guilherme, um janota de brechó e com sorriso amarelado, emendou rapidamente. --Este elevador é seguro. Eu garanto.

Antes, nada tivesse dito. Bastou a frase ser proferida, e as lâmpadas se apagaram.

--Meu Jesus! Hecatombe!

--Quem falou essa asneira? --Dona Emma perguntou, como se sentisse indignação pela ignorância que ouvira.

--Foi a Jandira! --a resposta, em voz masculina, veio do fundo do elevador. --Ela só sabe falar do “fim do mundo Maia”!

--Tinha que ser essa oxigenada! --Dona Camélia completou, em tom zombeteiro. --E você deve ser o traste do marido dela, que só sabe pagar as contas dessa perua descabida e mal vestida! Tá aí, com esse micro-vestido e acha que está trajada. Despudorada.

--Mais educação, gente! Se não podemos conviver harmoniosamente lá fora, ao menos aqui vamos manter o respeito até que alguém venha em socorro. --tornou o janota, querendo amainar os ânimos.

--Eca! Que cheiro é esse? --Jandira perguntou e segurou no braço daquele que ela pensava ser o marido. --To com medo, morzim. Não gostei do barulho deste cheiro.

--Jandira! Cheiro não faz barulho! E seu marido está para o outro lado. Eu sou o Guilherme. Mas, que este cheiro está horrível, isso está! Que foi isso, afinal?

--Foi essa desenxabida da Camélia. Deve ter almoçado batata-doce e soltou um pum! --Dona Emma emendou rapidamente, num tom maldoso.

--Não solto pum. Sou chique. Eu flatulei.

Novo ruído, agora estridente, tomou o ambiente, e foi seguido de outro sacolejo, o que ouriçou ainda mais aos pobres náufragos do elevador. Repentinamente, todos ficaram em silêncio, e um silvo recortado e repetido se fez ouvir.

--Ecaaa.  E agora? Esse maldito cheiro de novo, e fez barulho, seu Guilherme. Viu como cheiro faz barulho? --Jandira comentou, quase berrando aos ouvidos do homem que estava ao seu lado.

--Jandira, meu amor. O Guilherme está do outro lado. Eu sou o seu marido. Não precisa gritar, pois está escuro, e isso não diminui minha capacidade auditiva. Mas, honestamente, você está com a razão. Dona Camélia, por favor!

--Não foi ela, fui eu! --Dona Emma respondeu, tomando as dores da outra senhora. --To nervosa, e quando to assim, meus intestinos entram em pânico. E qual é o problema? Vou fazer de conta que o senhor nunca peidou pela vida afora.

--Aaaiiii! Quem me bateu? --o janota berrou, nitidamente descontente e irritado.

--Fui eu, seu tarado! --Dona Camélia também berrou. --Que história é essa de apalpar meus seios?

--Não apalpei seio nenhum! Só queria apertar os botões do painel, sua maluca! E me bateu com o que, afinal? Com um cacetête?

--Não. Com meu bastão retrátil de metal, de 60 centímetros de haste. Mas para tarados, tenho outra coisinha aqui. Quer ver?

Uma faísca azul iluminou todo o ambiente, e veio acompanhada de um barulho esquisito, imitando uma descarga elétrica. A gritaria foi geral, e quando a luz azul cessou, o que se escutou foi o estatelar de alguém ao chão.

--Gostou do meu choque elétrico, seu mauricinho de quinta categoria?

--Dona Caméliaaaa! Foi o meu marido que a senhora estrebuchou. Ele enfarlicou, e nem um suspiro o tadinho soltou. A senhora matou ele! --Jandira reclamou, meio soluçante.

--Errei? Não tem problema. Tem mais um pouco de carga. Vem cá, seu traste, que vou te mostrar a não abusar mais de velhinhas indefesas! Cadê você?

O ambiente iluminou-se novamente num tom azulado, mas desta vez, ninguém gritou.

--Errou novamente, sua maluca! --o janota respondeu, em tom zombeteiro.

--Mas acertei alguém! Quem foi? --Dona Camélia mostrou-se reticente.

--Ah! Não! Quem soltou esse pum agora? --Jandira perguntou, recuperando-se do susto anterior.

--Acertei a Emma! E meu Deus! Que cheiro de peixe podre é esse? Ela peidou de novo! Tudo culpa sua, seu tarado. Vem cá, que tenho mais um presentinho pra você!

--O que a senhora vai fazer agora? Tá maluca?

Diante da dúvida sobre o que Dona Camélia faria, o janota tentou sair para o lado e tropeçou, caindo e enroscando-se ao vestido de Jandira, que por ser pequeno e preso apenas na altura dos seios, foi basicamente arrancado do corpo da moça. Ela, agora nua e tentando se abaixar para socorrer o marido, desesperou-se ao perceber que alguém arrancara sua única peça de roupa. Sem saber o que fazer, apalpou o chão e agarrou-se à roupa de Dona Camélia, puxando com toda a força, mas voltou ao chão.

--Você está aí, seu tarado? Quer arrancar minha saia, é? Vou te mostrar a não abusar de uma donzela meio virgem! Toma! --Dona Camélia também se desesperou, sem saber ao certo o que acontecia.

image by Google
Novo barulho, agora parecendo um spray ou algo do gênero. Em instantes, o ambiente foi tomado por uma nuvem extremamente ardida aos olhos, o que fez Jandira puxar ainda mais a saia de dona Camélia para baixo, até quase tirá-la. Dona Camélia não entendeu o que estava acontecendo e desequilibrou-se, sentando-se e espirrando novamente aquele líquido. Jandira levantou e levou com ela a saia da senhora idosa, enquanto o janota protegia o rosto com o vestido da moça.

--Que inferno foi esse que você espirrou, sua velha doida? --o janota perguntou, arfante e tentando limpar o rosto.

--Spray de pimenta. E devolve minha saia, seu tarado, que eu saí desprevenida da cintura pra baixo.

--Não peguei sua saia. Tá maluca? To com um pano na mão, que nem sei o que é!

--É meu vestido, seu tarado! E me devolve, que também to sem nada por baixo. To peladinha aqui! --Jandira suplicou, tateando as pernas de dona Camélia.

O reboliço foi geral e ninguém se entendia. E também pouco notaram que, lentamente, o elevador descia até o térreo.

Lá embaixo, Emanuel, o porteiro, já esperava o elevador com as portas externas abertas, e quando ele chegou, o que se viu foi algo inusitado.

--Pela madrugada. O que é isso? --questionou o porteiro, que, de posse de seu telefone celular de última geração, filmava a tudo o que via.

No hall de entrada, várias pessoas também estavam boquiabertas. Dentro do elevador, o gás de pimenta ainda forçava seus ocupantes a manter os olhos fechados pela ardência.

Jandira estava completamente nua. O janota, com o vestido de Jandira aos olhos, dava a impressão de que cheirava o vestido da moça, e ela, com os olhos e a boca ardendo, passava a saia de dona Camélia pela boca, tentando eliminar o gás de pimenta que a incomodava. A moça, querendo se por em pé, segurava agora as pernas do janota.

Ao chão, o marido de Jandira, ainda desmaiado e estatelado, estava  com a boca bem próxima à boca de dona Emma, que se mantinha deitada de barriga para baixo. O detalhe que mais chamou a atenção de todos, no entanto, foi justamente a situação de dona Camélia, que além de se encontrar nua da cintura para baixo, ainda esfregava o rosto em algum tecido para tentar, assim, limpar o gás de pimenta dos olhos. E o primeiro lugar que ela encontrou, diante de seu desespero, foi o tecido da saia que cobria as nádegas de dona Emma.

O murmúrio contagiou a todos, mas foi imediatamente contido por um barulho estranho, como um silvo que se repetia de forma entrecortada. E logo, alguém professou em alto e bom tom.

--Camélia, minha véia. Não bastasse a pouca vergonha de eu descobrir que você é sapatão, vocês ainda poluem o ambiente com esse cheiro de gambá bêbado! Ecaaaaa. Quem comeu batata-doce?

No dia seguinte, uma nota enorme no jornal chamou a atenção do porteiro do prédio.

SIM, HÁ ALGO DE PODRE NO REINO DA DINAMARCA*.




*Príncipe Hamlet, em Hamlet, de William Shakespeare.


Marcio JR

domingo, 20 de maio de 2012

SENSAÇÕES QUE O TEMPO JAMAIS LEVARÁ (para André Bessa)

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Antigamente, o domingo era um dia especial. Hoje, sou honesto em falar, prefiro ter dois sábados na semana. Sequer sei dar uma razão para tal fato, mas uns 30 anos atrás, adorava quando o domingo chegava.

Era um dia preguiçoso o tal do domingo. Mesmo sendo um dia para descansar, logo cedo tinha missa, e mesmo que eu não fosse, precisava sair cedo da cama da mesma forma, pois alguém precisava cuidar da churrasqueira. No verão, isso não tinha importância, mas no inverno, a coisa era bem diferente. Quem mora de São Paulo para cima, e nunca veio mais ao sul no inverno, não sabe o que é levantar cedo e ver (sentir também) uma crosta de geada congelando gramados e telhados. Sair da cama com uma temperatura beirando os 2 ou 3 graus era terrível. Mais depois chegavam as visitas para o almoço, e assim, a manhã terminava.

Minha tarde de domingo era dividida em duas partes, isso quando eu tinha lá meus 15 anos de idade. A primeira parte ficava destinada à televisão e alguns outros afazeres de uma criança normal da época. Não existiam computadores ou celulares, e video-games ainda capengavam ou eram artigos de luxo da classe alta. Os divertimentos ou brinquedos eram manuais, e a tal da eletrônica (que sequer sabíamos o que era), ficava lá na TV apenas. Ainda tinha o rádio, os amigos na rua, a correria sadia e as poucas paqueras. Mais para o fim da tarde, no entanto, era a hora que eu mais gostava. Nessa parte do dia, meu pai terminava de ler o jornal e eu tinha acesso ao caderno de variedades da Gazeta do Povo, um jornal aqui de Curitiba. Sim, eu, com 15 anos de idade, lia o caderno de variedades de um jornal. Lembro bem que, aos domingos, o caderno era composto de várias crônicas, e aquilo me seduzia. Nem sempre tínhamos condições de comprar um jornal de domingo, e isso me fazia colecionar as crônicas e guardá-las, para ler posteriormente. Pois é, eu colecionava crônicas no lugar de figurinhas. 

Era um exercício de prazer poder ler o Cony ou o Veríssimo. Por vezes, a Lygia Fagundes Telles ou o Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto) assinavam alguma crônica, ou ainda o Rubem Braga, João Ubaldo, Otto Lara... eram tantos, que ficaria citando nomes aqui por linhas a fio. Meu Deus, que saudade de abrir aquele jornal sobre a mesa e sujar os dedos com a tinta preta das páginas. E sabe? Uma crônica tinha cheiro. Duvida? Até hoje, ao sentir cheiro de tinta de impressão, ou de jornal novo, recém comprado, algo remexe em mim e me dá uma nostalgia sem igual. É o cheiro da saudade de uma crônica entrando pelos olhos de um menino de 15 anos de idade.

Algum tempo depois, na escola, veio a lista de leitura para o trabalho de férias. Ler “Antologia Escolar de Crônicas”. Confesso que nunca fui adepto às leituras impostas pela escola, e já discuti muito sobre isso (prefiro nem tomar tempo e linhas por aqui), mas fiz festa quando comprei o livro. Lê-lo foi algo que me envolveu ao extremo. Algumas crônicas do livro já me eram velhas amigas, enquanto outras me apresentaram nomes como Euclydes Camargo Madeira, Carlos Drummond de Andrade, Lêdo Ivo, Wilson Bueno, Rachel de Queiroz, e tantos outros. Ao terminar o livro, pensei comigo: QUERO SABER ESCREVER COMO ELES. QUERO TER UM ESTILO. GOSTARIA DE SER CRONISTA.

Image by Google
Desse tempo para cá, tomando por base meus 15 anos de idade, já passaram longos 29 anos. Lancei minha primeira crônica aos 17 anos de idade, ainda na escola, e aos 18, fui publicado num jornal. Era um jornal de bairro, e até creio que além de mim, poucos (ou mais ninguém) leram o que escrevi. Tudo bem, e mesmo assim, considero esse meu primeiro feito. O tempo passou, virei Ghost Writer, e saí compondo para aqueles que queriam escrever mas não tinham tempo. Muito do que escrevi está por aí, perdido e no nome de outra pessoa. Tudo bem também. Valeu como um exercício.

Hoje, com a internet e as redes sociais, publico meus escritos regularmente. São contos, fábulas, parábolas, algumas poesias (depois de publicar, re-leio e fico até com vergonha de dizer que fui eu que escrevei tal coisa), e minhas crônicas. Tem uns 27 anos que escrevo ininterruptamente, e ainda me considero um mero aprendiz, procurando por um estilo.

Não reclamarei da web, mesmo ela tendo me tirado o cheiro das crônicas e o prazer de ler aos domingos o caderno de variedades. Pelo contrário. A web me abriu um leque de novos cronistas sem precedente. Tem muita gente boa escrevendo, e que sequer teriam como fazer isso antes do advento da web. Tá certo que tem muita gente plagiando na cara dura, mas onde é que não tem pilantragem?

Conheci cronistas fantásticos nesses últimos tempos. A Celêdian Assis é uma delas. Teimosa que dói, pois acha que não é cronista. Li poucas crônicas dela, mas sei muito bem que se ela se propor a escrever mais, logo se tornará uma das melhores. Tem o Luiz Coelho, lá de Portugal, que faz relatos da vida como ninguém. A Ester Marques (Hadassa, para quem era do Recanto das Letras), com seu toque refinado. A Letícia Cunha, que está cursando Medicina em MG e que me mostrou um estilo todo próprio ao escrever. Fernanda Marinho, minha maninha e proprietária do blog Aleatoriamente, que escreve com paixão e amor no lugar da tinta. São tantos que admiro. Ah! Tem uma cronista que vai dizer que não é cronista, com certeza. A Samara Bassi. Sou literalmente apaixonado pelo estilo dela.

Só que havia um problema. Eu continuava sem um estilo definido.

Dia desses, meu amigo José Cláudio (Cacá) retornou de um pequeno período de afastamento, e me motivei novamente a escrever minhas crônicas. Não que eu tenha desistido, nada disso. Só me direcionei um pouco para os contos. Ler o Cacá é o mesmo que ser atiçado a escrever. Ele é um craque na arte. Simplesmente um horizonte para mim.

Alpes Suiços - Image by Google
No entanto, exatamente no dia 19 de maio de 2012, a saudade bateu forte, e consegui sentir o cheiro das crônicas novamente. Ao abrir o Blog do meu amigo/irmão André Bessa, quase caio de costas. Ele, um poeta maior e um cronista por excelência, publicou uma crônica ao estilo daquelas lá dos meus 15 anos de idade. Vi-me com um jornal aberto sobre a mesa e com os dedos sujos pela tinta do jornal. Não tenho um pingo de vergonha em admitir que chorei ao ler a crônica e, principalmente, por ela seguir com uma dedicatória a minha pessoa. Depois de vários anos, senti o cheiro de uma crônica exatamente como sentia antes.

André Bessa é um ser muito além do humano normal que conhecemos. Desprendimento e generosidade lhe sobram, e o talento, desse nem tenho como comparar a algo, pois ele extrapola qualquer comparativo. A crônica? SAI DESSA VIDA, ZÉ ROBERTO! Ri muito, chorei também, mas saboreei como a muito não fazia.

Ainda não consegui adotar um estilo para minhas crônicas, mas falei ao André que, se eu conseguisse, gostaria de escrever em BESSA MAIOR. Um dia eu chego lá.


Marcio JR

domingo, 13 de maio de 2012

A MENINA QUE AMAVA ARCO-ÍRIS

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Faz algum tempo, escrevi a fábula abaixo e mandei para alguém que não estava num bom momento da vida. O engraçado é que essa pessoa precisou chover um tanto para, posteriormente, enxergar um arco-íris na vida.

Nem tudo são rosas, no entanto existem muitos espinhos por aí. Espinhos de todas as formas e tamanhos. Eles cortam a pele, mas ela cicatriza, e o importante é saber que a dor não irá durar para sempre.

Um arco-íris não é sinal de um pote de ouro, mas ele sempre tornará mais belo o que, em algum momento, pode ter sido uma chuva forte ou, até mesmo, uma tempestade.

Musica: Elevation (U2) - by YouTube


Caso você não consiga acessar o player acima,
ao fim da postagem existe um link para o vídeo no YouTube.

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A MENINA QUE AMAVA ARCO-ÍRIS



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Num lugar qualquer, repleto de uma vegetação exuberante, nasceu uma menina predestinada a um feito complexo: ser feliz.

Ela cresceu rodeada de amor. Todos a adoravam, e ela tinha uma vida que muitas crianças sonhavam. Muito traquina, ela brincava solta e livre, e tudo o que ela queria, conseguia com seu jeito meigo e doce. No entanto havia algo que ela, por mais que quisesse e admirasse, não conseguia ter. Um arco-íris. Quando via um, saía correndo atrás, mas por mais que se apressasse, nunca conseguia chegar perto. E todas as vezes que isso acontecia, ela entristecia.

Existiam poucas coisas que ela não gostava. A chuva era uma delas, e sempre que as nuvens escureciam, ela desanimava e ficava triste.

O tempo passou, e aquela pequena menina se transformou numa mulher bela e altiva. A paixão por arco-íris também cresceu, e num dado dia, ela tomou uma decisão: correria o mundo atrás daquilo que tanto queria, ou seja, um arco-íris. Sabia que precisava alcançar um, ou jamais sua felicidade estaria completa.


Andou pelo mundo... andou, andou e andou. Nada. Ela enxergava de longe aquelas listras arqueadas de cor e luz, cada vez maiores e mais belos, mas nunca conseguia pegá-los. E havia outro problema, pois eles sempre vinham rodeados de chuva fina, e aquilo, para ela, era terrível.

Já cansada e desanimada, sentou num bosque e conversou com Deus. Questionou o porquê dela não conseguir ter ao alcance das mãos algo tão simples, mas que a faria tão feliz. Chorou, e adormeceu.

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Alguns minutos depois, algo estranho aconteceu. Pingos de chuva molharam seu rosto, e fizeram-na despertar. Ela desanimou de vez. Irritou-se com a chuva. Mas, ao abrir os olhos, reparou que, além da chuva, raios solares vazavam por entre as árvores e batiam em seu corpo. Foi nessa hora que ela pode ver algo que a deixou boquiaberta.

Com a chuva e os raios solares, um arco-íris, pequeno e particular, formou-se exatamente sobre ela. Ele saia de seu peito e ia até seus pés. E naquele momento, mesmo no meio da chuva que ela tanto repudiava, ela conseguiu o que tanto buscava. Um arco-íris só dela.



Marcio JR

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Segundo novas diretrizes do YouTube, alguns vídeos não podem mais ser executados fora do próprio YouTube. Quem utiliza os navegadores do próprio Google, como o Chrome e o Firefox podem assistir normalmente, mas isso não acontece com navegadores como o Opera ou o Internet Explorer.


Caso você não tenha conseguido ouvir a música do player que deixei na introdução do texto, mas tenha interesse em conhecê-la, click em um dos links abaixo:

música e letra:

vídeo oficial

sábado, 5 de maio de 2012

O RIO DOS SONHOS


Billy Joel

UMA EXPLICAÇÃO:

O texto a seguir não é uma tradução. Longe disso, pois em qualquer tradução, muitas vezes existe a perda da essência daquilo que se traduz. O que fiz foi apenas escrever o que sinto e visualizo quando ouço a música THE RIVER OF DREAMS. Sempre fui fã de BILLY JOEL, e no dia em que assisti ao vídeo desta música pela primeira vez, descobri algo em mim mesmo que ainda não conhecia.

A música contagia, e ao fim do texto, colocarei o vídeo para que você possa constatar por conta própria o que estou tentando escrever nesta introdução.

Boa leitura.

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O RIO DOS SONHOS


crônicas de uma música


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É noite, e meu corpo cansado repousa. O sono, no entanto, não é suficiente para deter minha alma, que se aviva e sai numa busca que já dura décadas. São caminhadas longas e espinhosas, e ela sempre retorna de mãos vazias, porém, sem jamais desistir.

No caminho, minha alma encontra montanhas altas. Muitas noites foram necessárias para que ela pudesse prosseguir, pois escalar aquelas montanhas era algo quase impossível. Uma noite, no meio da escalada, minha alma despencou, e neste instante ela reparou que flutuava. Pediu com tanta força para que não descesse novamente ao chão, que voou lindamente.

Depois das montanhas, meu espírito chegou ao rio. Mas ali, não adiantaria voar, pois os pés deveriam tocar a água. Minha alma sabia disso. Era preciso andar, cruzar aquele profundo poço em corrente forte, e se fosse o caso, pagar por isso com o fim da própria existência. Foi quando o medo tomou novamente meu espírito. Minha alma andou muito, até chegar na praia. Ia e voltava, mas não atravessava.

Seria lá, na outra margem, que estava o que minha alma tanto buscava? E o que seria? Um tesouro que me foi tirado? Ou então seria algo sagrado que me foi confiado e perdi por meu descuido?

O vale do medo era atravessado a cada noite que minha alma voltava ao rio, e o vale e suas criaturas já não assustavam mais. Nem as montanhas me seguravam. Sentia que aquilo que buscava era como se fosse um pedaço de mim mesmo, um pedaço de minha própria alma, e eu iria buscar. Estou cansado. Não quero mais andar, mas preciso. Vou adiante, nem que arrastado, mas vou. Termino aqui minha vida, e me entrego ao desconhecido, mas não desistirei. Sequer a selva das dúvidas me parou, e não será um rio que fará isso agora.

Outra noite chega, e lá vai ela. Agora, ela sabe que enfrentará a escuridão, o desfiladeiro das nuvens negras. Mas pouco importa, pois durante todo esse tempo, ela aprendeu a enxergar o escuro com os olhos do cego, e jamais se perderá. Somente o rio. Ele sim pode me parar.

Sequer sei se existe uma vida após esta vida, pois a pouco tempo atrás nem em alma eu acreditava. Deus me batizou pelo fogo quando ensinou minha alma a voar, mas não ensinou como nadar. Lá, do outro lado do rio, está a terra prometida e o que eu tanto procuro. Não esperarei mais.

Todos nascemos em pequenos olhos d’água e desaguamos em oceanos, então, por que o medo? No meio da noite, as águas refletem o luar e chamam minha alma, que não se contém e pisa o passo mais difícil, o primeiro. Estranhamente, a água não é fria, e sequer molha meus pés. Outro passo, e mais outro, outro... outro.

Minha alma não mergulhou, mas também não flutuou. Minha alma andou sobre as águas. Nesse instante, achei o que tanto minha alma procurava. Enfrentei todos os medos, todas as dúvidas e as criaturas mais estranhas e perversas. Reencontrei minha FÉ.





Nota:
Infelizmente, o conteúdo do vídeo oficial é propriedade da VEVO, e não é liberado para execução fora do YouTube. Para aqueles que desejarem assistir ao vídeo original, acompanhar a letra da música ou sua tradução, basta acessar um dos links abaixo.




Marcio JR